PARA QUE UM DIA NÃO DIGAM BESTEIRA

O desconhecido sempre provoca deduções, e muitas das deduções são equivocadas. Alguém disse coisas que me incomodaram, se fossem verdades, jamais teriam me chateado, mas para um trabalhador é incomodo ser chamado de vagabundo.

Nesse texto vou me ater a um breve resumo da trajetória profissional não-artística que percorri até o final do ano de 2009.

Para que se registre: comecei a trabalhar aos 15 anos em um trailer de hambúrguer’s, meu serviço começava pela manhã, quando eu tinha que ir ao estabelecimento limpar o ambiente e lavar os banheiros utilizados por bêbados e demais. Eu voltava a noite para servir os pedidos de clientes e entre uma brecha e outra aprendia como fazer um x-tudo.

Fui fichado aos 16 como ajudante de padeiro, comecei lavando vasilhas, limpando latas (formas), fazendo faxina no local, carregando sacos de farinha de 25 e 50 quilos para cima e para baixo, e por mais simples que pareça, minha primeira promoção foi designada para rechear sonhos, depois passei a olhar o forno e aos poucos fui ganhando a confiança do patrão. Eu trabalhava noite/dia/domingo/feriado com uma folga aleatória na semana, o dia que desse era esse mesmo; meus domingos eram trabalhados quase que 12 horas por dia quando eu vinha das dobras do fim de semana, citarei um exemplo corriqueiro que já aconteceu: continuando a jornada semanal, na época que eu trabalhava a tarde, largava serviço as 10 da noite da sexta e pegava no dia seguinte de 6 da manhã as 6 da tarde, voltava novamente as 10 da noite do sábado e ficava até as 6 da manhã, quando começava o primeiro turno, acontece que esse turno muitas vezes faltava, e durma com essa: eu ficava lá, quase que até o meio dia de domingo. Sintetizando: geralmente eram 33 horas de trabalho e 12 de “descanso”.

Trabalhei nessa empresa por 2 anos (com muito orgulho), saí de lá aos 18 como padeiro e fui ralar em uma padaria maior. Depois entrei para uma indústria de peças automobilísticas, eu era auxiliar de produção a noite. Simultâneo a isso, me formei no ensino médio e passei no vestibular de Comunicação Social, estudei na capital por 6 meses, e por causa disso arranjei emprego em uma grande financeira.

Posteriormente consegui uma bolsa de estudos do governo federal para cursar Letras em uma respeitada universidade, tive que abrir mão do emprego na financeira porque eu precisava estudar aos sábados pela manhã. Nesse meio tempo, com todo dinheiro que já havia juntado, abri em sociedade uma quase empresa varejista do ramo de alimentos - quebramos com apenas um ano de funcionamento. Depois, graças ao curso superior, me virei empregaticiamente com os estágios vinculados entre universidade e prefeitura, meu ordenado era menor que meio salário mínimo por mês. E embora nesse período eu não tenha tido uma carteira assinada, fundei uma revista com a qual trabalho até hoje.

Depois ainda dizem que eu sequer tenho um ofício/emprego e que sou sustentado pelos meus pais. Realmente, ainda sou dependente da minha mãe, estou com 23 anos e se não fosse por ela nada disso teria acontecido. Graças a Deus nunca me faltou nada, tive uma condição de esmero mais privilegiada do que meus irmãos mais velhos, sou a rapinha do tacho, o caçula, e nem por isso deixo de alçar meu caráter no respeito a vida e ao particular. E quer saber: não me importa se um cidadão é mimado, tem tudo, ou seja lá quais suas condições, o que me importa: é quem essa pessoa é, e o quão humilde pode ser de coração. Não vamos comparar as cicatrizes, cada um tem as suas - isso forma a pessoa que somos independente de dinheiro ou situação social.

*Texto verídico sobre minha vida. Espero que possa servir de reflexão contra julgamentos prévios e pré-conceitos.