DEIXE-ME FALAR

Hoje decidi falar de mim.

Percebi que fazia tempo que não escrevia por prazer. E ao ver outras coisas que tenho deixado de lado, pergunto no que me transformei. Não é exagero. Eu meu transformei.

Pode ser o processo que chamam de amadurecimento.

Como diz Jabour: “Quem disse que ser adulto não dói?”.

Mas eu defendo a bandeira da alegria infantil.

Sempre cresci com muitas responsabilidades, cobranças, estereotipada como uma criança adulta. Sempre tomei decisões sozinhas sobre a minha vida, estudei muito e trabalhei muito mais ainda. Mas só agora percebi que as horas que deixei minha boneca dentro da caixa para ler um livro em inglês, aos sete anos, me tornariam esta pessoa com síndrome de Peter Pan.

Todos se acostumaram a dizer que a minha vida é de sacrifícios. E eu também me acostumei com isso.

Comecei a trabalhar aos 14 anos, não posso falar que foi por necessidade financeira. Foi por necessidade ideológica. Eu nunca consegui imaginar dependente de outras pessoas, nem mesmo dos que me trouxeram a vida. Neste período, vivia entre escola, curso técnico e trabalho em uma grande multinacional. Foi neste período também que meus sonhos passaram a ficar ainda mais dentro da caixa. Abandonei a dança, abandonei a arte e fui fazer o que era mais seguro.

Aos 16 anos sofri a maior dor da minha com o falecimento daquela que era meu guia, minha mão amiga. Fiquei ainda mais sem rumo e ainda com mais responsabilidade. Aos 16 anos, a felicidade de uma família estava nas minhas mãos. Era assim que me sentia.

Aos 17 anos entro em uma faculdade particular. Não queria estudar este ano pelo cansaço acumulado, mas o senso de responsabilidade gritou ao meu ouvido que não poderia perder tempo. Passei em primeiro lugar, ganhei uma bolsa integral e me formei em publicidade e propaganda, sendo laureada, posteriormente. O que ganhei com isso? Um diploma para orgulhar minha mãe e fazer renascer o sentimento de porto-seguro felicidade.

Hoje, enquanto escrevo este texto, lembro em me sentir privilegiada e agradecer ao cargo de direção que ocupo. Ao meu currículo. Ao meu conhecimento, amigos formados nesta correria. A tudo que conquistei

Mas escrevo principalmente como um alerta. Alerta a infância perdida, aos sonhos e vontades deixados em algum cantinho do quarto de princesa. As perspectivas de vida que fazemos no primeiro de janeiro e que nunca saem do papel. Reforço que criança precoce não deve servir de estimulo, que ser adulto dói para adulto, imagina então para uma menina?

Sempre é tempo de vencer? Certo.

Mas sempre é tempo de mudar também.

Sou a favor da vida.