CARTA ABERTA A AMIR

São Paulo, 09 de novembro de 2010

Meu caro AmIr, tu que guardas o próprio nome verdadeiro oculto sob as rochas: Não esperes por mim nem queiras de mim o que há décadas-milênios pertence a outro e só a outro.

Tu, mesmo sem que o soubesses, tentaste substituir esse outro, também desconhecido por ti, em meu imaginário; tentaste, sem sabê-la plenamente, a esta tua tentativa e eu, por breve tempo, me senti tentada a me deixar levar, mas, para me permanecer fiel, devo prosseguir ao longo desta Solidão; prefiro isto a enganar-te, Amir, que não tenho efetivamente a te oferecer o que, com tua poesia extraordinária, pretendas de mim.

Não te posso ser Musa tardia nem amante virtual e, por teu lado, não tens realidade alguma que me possas ofertar, a mim que há muito vivo a morrer, à falta de realidade, Amir. Não posso nem tenho o direito de me acelerar mais o processo desta morte cotidiana, que ainda me cabe mãe a cuidar.

Esta que reencontraste séculos após a nossa tenra juventude, esta hoje é Outra, meu amigo. Desde aquele tempo passaram-me muitos céus e terras e mares e vidas, vidas, mares, terras, céus dos quais não te devo nem posso nem jamais te poderei falar.

Compreendo, certamente como quase ninguém o poderia, o tamanho da tua própria Solidão, Amir, que em compreender solidões especializei-me, a fundo, ainda que jamais tenha defendido teses oficiais. És homem e determinadas compreensões de destinos de mulher te são veladas, não por falta de antenas poéticas e existenciais, que as tens de sobra. Devo reiterar: há segredos que não pertencem apenas a mim e que, se os pudesse revelar, tu chegarias até onde poucos homens tiveram o privilégio de chegar.

Não me resta outro caminho senão pedir-te que partas, Amir. Parte, não te detenhas em mim. Se tivesses voltado antes da entrada do outro, e isto deveria teria sido há muitos, muitos, demasiados anos, talvez nos tivesse havido a chance de construir alguma nossa história, mas, o homem põe e Deus dispõe. Agora é tarde demais. Claro, peço-te,a um de ti, para partir. O amigo Amir será sempre bem-vindo,sempre, aos recantos do meu ser.

Da tua amiga

Zuleika.