UM PEDIDO CUMPRIDO

Caro amigo, Clauder Arcanjo!

A alegria de ver, mesmo que seja em uma crônica apenas, a subjetividade do escritor, que sabe, nas entrelinhas, dar um sentido todo especial ao pensar dos seus leitores, é que me fez indiscreto para convocá-lo a discorrer sobre o cotidiano das coisas.

Verdade. Domingo passado, em meio às festividades de final de ano da Gazeta do Oeste, eu, esquecendo-me do protocolo de apenas conversar sobre as superficialidades que a noite exigia, solicitei ao nobre escritor que me desse, como presente de Natal, o prazer de uma crônica, daquelas em que a narrativa vem recheada de frases onde as palavras - mescladas entre o erudito oficial e aquela modalidade que todos nós, nordestinos, entendemos – (e que nos faz lembrar de que o maior universo existente é o das nossas raízes) nos remetem aos contos de Licânia.

De fato, eu não deixei o caríssimo colega colocar, de forma a me convencer, os motivos de estar apenas escrevendo minicontos. Não, meu caro. Felizmente, eu sei os motivos. E eles são sublimes. Inserir o jovem na leitura, principalmente a literatura, é um gesto de desapego e um esforço que estamos vendo, a todo domingo, no caderno Expressão. Lá, em pequenas doses – para não cansar a pressa que alguns jovens têm para com os escritos –, o amigo discorre, em pouquíssimas linhas do periódico, episódios que, para quem gosta de uma boa leitura, fazem a imaginação viajar por duas, três, quatro laudas.

Desculpe-me, mas não percebi, no cronista, a ansiedade causada pela solicitação. Mas, confesso que vi, nos olhos do literário, o brilho responsável por já estar matutando o princípio das linhas daquele inusitado pedido, como certa vez você escreveu: eu sempre quis escrever uma crônica que começasse por “era uma vez...”

Assim, quando nos despedimos, tive a certeza de que, no mínimo, o meu pedido seria analisado com carinho. Alguém, certa vez, me falou que, viajando ao seu lado – de Mossoró a Natal –, ao sentar-se no banco do carro, a primeira coisa que você fez foi abrir um livro para lê-lo. A viagem, para você, era apenas o complemento de uma rotina. O livro era a companhia constante e amiga de todos os dias. Ah! Ele ainda disse que não foi sem fazer nada: você presenteou-lhe com um livro para servir, a partir daquele dia, como a companhia mais amiga de sua rotina.

A semana passou, Clauder. No corre-corre dos deveres, na deliciosa responsabilidade de escrever na mesma página em que você também escreve, o descuido de deixar – esquecido na pasta lembranças – o pedido de Natal.

Domingo de novo. Antes, na sexta-feira, uma notícia maravilhosa: a minha filha (jornalista) tinha acabado de passar no Mestrado da UFPB para Comunicação Social. No sábado, o prazer de assistir à colação de grau das crianças do Centro de Educação Infantil Santo Antonio. Quase fui às lágrimas! Por isso, quando o dia amanheceu, eu fui esperar o meu jornal – como faço todos os domingos – na frente da casa. Lá, enquanto cumprimento os vizinhos, espero, com ligeira ansiedade, a chegada do gazeteiro.

Ah! Ia me esquecendo... Tenho certas manias, por exemplo: quando o jornal chega, o primeiro caderno que abro é o Expressão. A primeira coisa que leio é a coluna Questão de Prosa. É um hábito desde 2005 (o tempo passa, não?). Diria que é um salutar ritual para com o jornal de domingo.

Neste domingo não foi diferente o ritual. O susto sim. E dos grandes. Quando vi o título e, logo abaixo, o meu nome, a temperatura subiu.

Bem, para começar, o prólogo estava maravilhoso. A sua visão holística das coisas desenhou – e inseriu - o universo de todas as pessoas, nesta data significativa. O implícito, através das promessas e pedidos, nos faz refletir que, a cada ano que passa, deixamos para trás mais um ano de sonhos e incertezas. É como se a vida fosse renovada a cada primeiro dia do ano que se inicia. Como disse você: “as ilusões trazem, dentro de si, um cadinho de remédio para os espíritos cansados”.

Antes do breve diálogo que travamos, a sua preocupação para com o restante dos leitores. Você se faz pedido (também) e convida o leitor a ter paciência, pelo menos, por breves linhas, até entrar no principal. Sabe, por textos escritos, que o leitor gosta da suavidade, do humor leve, da reflexão matinal (que apenas lhe abra o sorriso), da eventualidade do coloquial – e nisso o cronista é bom – e, através dos parágrafos iniciais, vai guiando a leitura para o foco que o levou a escrever a crônica.

Bem pensado. Descrever o momento do pedido foi magistral: “Confesso que perdi a fala. Esbocei um sorriso pequerrucho, daqueles que nem precisamos mover os lábios; apenas um, dois ou três músculos da face, dos mais juntos ao contorno da boca”.

E, aí, você entra na crônica. E já inicia poeticamente. A lua, como testemunha, abençoa a fidelidade do amor e o presenteia com a consagração de renovados votos de cumplicidade. Foi, Clauder, o estímulo inspirador para que essa joia fosse escrita, como a galope: “Ande, venha logo, sua arisca!”

Ela veio, dileto autor. Veio acompanhada da certeza de que promessas nem sempre são deixadas no esquecimento e, que, pedidos são para serem cumpridos, especialmente entre os amigos. Ah! As juras também. Que o diga a sua (com todo respeito) Biscuí...


 

Antonio Clauder Alves Arcanjo nasceu em Santana do Acaraú/CE, é 
engenheiro, professor, contista, poeta, cronista e resenhista literário e escritor (Lápis na Veia - Poesias e, Licânia - Contos) e um dos coordenadores do projeto Pedagogia da Gestão.


Obs. Capa do Livro "Lápis na Veia".


 

Raimundo Antonio de Souza Lopes
Enviado por Raimundo Antonio de Souza Lopes em 26/12/2010
Reeditado em 04/02/2012
Código do texto: T2692211
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2010. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.