Como Aquele Pássaro!

Ontem nos encontramos, ontem o dia foi maravilhoso. Ontem eu te consolei, ontem tu me consolaste. Ontem choraste nos meus braços, no dia de ontem também despertaste o meu sorriso. Ontem foi mais um capítulo duma novela chamada “purgatório-paraíso”, pois em capítulos como o de ontem é que estudamos o nosso próprio destino, o destino de ”nós”, para onde vamos ou por onde nossos sentimentos caminharão, nestas horas é purgatório; por outro lado, este julgamento é um momento de felicidade, já que nos encontramos e trocamos nossas palavras de carinho, sendo assim, também, paraíso.

Hoje, então, sobrou para mim a saudade daquele tempo, não somente do tempo de ontem, mas também do tempo em que eu ainda chamava-te de “senhorita”. Em que eu a tratava como se o romântico fosse eu! Idiota eu era (como ainda sou). Naquele sorriso tímido de menina se escondia uma apoteose de mulher; mulher que sabe amar, que tem o romantismo nas veias. Tempo em que para mim atiravas o teu sarcasmo e testava a tua paciência, já que não percebi o teu romantismo de primeira. Primeira fase do nosso amor foi a tua paciência versus minha insistência.

“-Chega de brincadeira, menino.” – resistias tu aos apelos meus. E eu dizendo intensamente que te amava e tu duvidavas muito plenamente, como hoje ainda, um pouco... A “Senhorita” mais simpática é também a mais desconfiada. A mais bela entre as tantas é tão desconfiada que não acredita na própria beleza! Pobre menina que não se reconhece grande nem bonita nem encantadora, mas por quê? A questão é que desenvolveste uma defesa quase natural, formada pelas experiências dos que disseram te amar e traíram a tua confiança. Nada mais normal.

Prova de amor, para mim, a maior já me mostraste: teve confiança em mim, se abriu de uma forma delicada e gostosa, na qual os teus sentimentos e conflitos me invadiram como se fossem conflitos meus... Maravilhoso! Esta relação de confissão, ajuda e cumplicidade nos fez seres unidos por um laço maior que o do prazer, o da alegria, o da felicidade. Um pelo bem estar do outro, somos unidos, na verdade. O que se mostra em encontros como o de ontem, no qual o apoio e a compreensão de ambas as partes fizeram-nos, mais uma vez, mais fortes.

E, hoje, aquele teu escudo ainda continua ativo, porém, agora, me acolheste dentro dele, e nós somos fortes e protegidos contra as coisas que nos fazem mal: eu te protejo, tu me proteges. Falta-nos apenas as coisas simples de uma relação, pois a égide de nosso amor já estar formada. Que a nossa novela termine, mas não tenha final, ou seja, que me dê o teu corpo, que me dê o teu carinho e que eu te retribua em igual intensidade, acabando, assim, de vez com o purgatório; entretanto que gozemos ainda do paraíso.

Hoje, amor, entrou um pássaro aqui em casa. Ele era pequenininho e um cinza fosco coloria suas raras penas, voava desajeitado, se é que se chama aquilo de voar, na verdade, ele se escorava pelos cantos. Sua visita era tão inesperada... Antes de chegada dele, em minha casa, estava tudo normal – mas, o que pra nós é normal?! Consideramos normal o marasmo, a letargia das coisas, ou seja, quando as mudanças são nulas ou leves... Em nossas vidas surgiu o amor, como se de repente abalássemos a normal. Inesperado, apoiado pelos cantos, fosco, desajeitado e pequenino. Elen, lembras? foi assim que surgiu o nosso amor.

De Andrié Keller para Elen Keller,

Quebrando a promessa de não te escrever,

E desta vez com um carinho extra,

4 de dezembro de 2006

Lauro de Freitas-BA.