O simples e o complexo. O côncavo e o convexo.

Na química, as coisas são bem mais fáceis. Vê se me entende, menino: se ficar rosa, é ácido. Se ficar incolor, é básico. Simples. Objetivo. É como o português: todas as proparoxítonas são acentuadas, sem exceção. E até mesmo a tão odiada matemática: são apenas regras chatas e cansativas. 1 + 1 é 2, e não se fala mais nisso. O Iluminismo inspirou a Revolução Francesa, e pronto. Um movimento retilíneo e uniforme não possui aceleração. “Ideia” não tem mais acento. O Barroco era caracterizado por antíteses, paradoxos, contradições. E tudo isso, no final, é quase a mesma coisa. Sem subjetividade alguma. Sem complicações.

Bom seria se as pessoas fossem assim. Quer, quer, não quer, não quer, e fim de papo. Se ama, ama, se odeia, odeia, nada de falsidades por aí. Nada de sorrisos falsos no lugar de lágrimas verdadeiras. Quem foi que disse, menino, que lágrimas são ruins? Quem foi que disse que dias tristes também não são importantes? Que graça teria um dia bonito, se a vida não tivesse lhe apresentado dias feios? De que valeria o sol, se você nunca tivesse visto a chuva? Ou vice-versa, talvez. Eu, particularmente, sempre gostei mais dos dias chuvosos. Simples assim, me entende? Gosto de chuva. Mesmo que minha roupa fique grudada ao meu corpo. Mesmo que minha garganta fique doendo por dias e dias. Isso tudo tem solução. Nada melhor do que uma boa chuva no fim da tarde.

Coisas complicadas me irritam. Veja bem, se você gosta de sorvete de morango, por que vai tomar o de chocolate? Se você gosta de dormir no escuro, por que deixa a luz do corredor acesa, iluminando parte do seu quarto? Medo de fantasmas? Que mal tem nisso? Diz logo, e acenda essa luz! Se você gosta de piano, por que está fazendo aula de guitarra? Seus amigos gostam mais? Ah, muito bom. E você se importa mais com seus amigos do que consigo mesmo, é isso? Deixa de complicação, deixa isso pra lá. Faz o que te agrada, e ponto final.

Quer dizer, se você a ama, por que foi embora? Você acredita mesmo que ela ficará melhor sem sua presença, é isso? Ela bem queria, menino, ela bem queria… Mas vocês dois são tão jovens, e gostam tanto da companhia um do outro… Volta logo, diz que sentiu a falta dela, e põe um fim nesses dias pacatos! Cria um recomeço e vai ser feliz!

Não sei… No fundo, no fundo, coisas complicadas me agradam. Vezenquando, a gente gosta mesmo de misturar as lágrimas aos sorrisos e ficar assim. Vezenquando, a gente gosta mesmo de um dia de exceção. E de tomar chá quando tem sol, sorvete quando tem chuva. E de um beijo cheio desejo, mesmo gostando tanto daqueles beijos suaves. E de dançar no meio do nada, com nenhuma música de fundo. E de brincar de pique-esconde, de corda, de pula-pula ou de boneca, ao invés de fazer o dever de química, de português, de matemática, de história, de física ou de literatura. Porque, no fundo, no fundo, isso é tudo simples demais, sem complexidade alguma. E, vezenquando, lidar com a vida real faz bem.

No final, sou Barroco puro. Sou pura antítese.

Raíssa César
Enviado por Raíssa César em 10/11/2011
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