Perdoe-me, foi puro amor.

Após uma vida inteira ao seu lado, repousar-me aqui em cima não tem sido uma experiência de completa paz e tranquilidade como afirmam por aí. Saio vagando no plano terreno frequentemente, só para dar uma olhada em você, e, por vezes, segurar sua mão e sentir sua presença ao meu lado mais uma vez. Cuidar de você. Lembra-se de quando você estava sentada, encantadora, em frente ao seu piano branco, tentando compor algo, mas não tendo sucesso algum? Eu estava ao seu lado. Eu consegui sentir uma melodia maravilhosa e inexistente naquele momento, e cantarolei-a bem baixinho em seu ouvido. Você pareceu entender, e reproduziu de modo perfeito e harmônico a som exato que saíra de meus lábios. Desde aquele momento, então, resolvi te visitar sempre e fazer com que você notasse minha presença nos mais singelos atos.

Daqui de cima, sou capaz de ver que você continua se perguntando por que fiz tudo aquilo. Por que, em meio à confusão, escondi seu corpo atrás do meu e sofri por nós dois. Por que te deixei sozinha num mundo tão hostil, fazendo com que você deixasse de viver por si, e passasse a viver na dolorida lembrança dos nossos dias tão doces. Talvez, tenha sido puro egoísmo meu. Talvez, eu tenha sido inconsequente ao tomar aquela decisão de súbito, e te empurrar para trás de mim, como se aquilo fosse proteger a você, e, consequentemente, a nós dois. Pensar em uma vida sem você seria cruel, exorbitantemente dolorido, terrivelmente solitário. E, numa situação conflitante como aquela, a única coisa que passou pela minha cabeça é que poderíamos seguir em frente juntos, se eu me jogasse na sua frente. Poderíamos ser felizes, como tínhamos sido até então, se eu me perdesse por você.

E, então, quem me perdeu foi você. Eu cometi um dos piores erros da minha vida por amor. Porque eu faria tudo por você, para ser sincero. Quando aquela bala ameaçou sair, não consegui pensar em nada que não fosse salvar a sua vida. Talvez, porque viver sem você era impensável. Talvez, porque a dor da perda da pessoa que mais havia me feito sorrir até então seria muito intensa. Pensei por mim, e esqueci que você também poderia pensar assim. E, por impulso, arrastei-lhe para trás, e, em questão de segundos, eu não estava mais ali. Pude te ver chorando, uma multidão de pessoas correndo e gritando, e eu sem poder agir, sem poder te acolher em meus braços. Eu estava ali, imóvel, enquanto você derramava lágrimas incessavelmente por uma atitude estúpida da pessoa que mais a amava.

Nunca tive a chance de pedir-lhe perdão pelo que fiz. Apesar de visitá-la em seus sonhos e tentar lhe dizer o que mais me atormenta há tanto tempo, prefiro olhar dentro de seus olhos e acariciar seus cabelos macios, na tentativa falha de fazer com que você entenda que eu sinto muito por tudo isso. Desculpe-me por falhar tantas vezes. Desculpe-me por nunca ter tido coragem de pronunciar uma palavra sequer enquanto te pego no colo e te aconchego em meus braços. Desculpe-me por não ter sido suficiente. Você foi minha vida, e eu fui uma parte da sua. Você não precisa, no entanto, sofrer por isso para sempre. Quando se lembrar de mim, abrace-se à ideia de que eu sempre estarei contigo. Lembre-se de que, apesar de tudo isso, eu só queria o seu bem. Olhe para o céu, e eu estarei lá. Mesmo que as nuvens escondam as estrelas como forma de tornar a noite mais sombria. Mesmo que a lua seja nova e desapareça na escuridão noturna. Não se esqueça, meu anjo: não existe noite escura num olhar que habita estrelas.

Raíssa César
Enviado por Raíssa César em 27/04/2012
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