ninguém como você

Vou escrever te mais uma vez, sem esperar resposta que me recomponha ou que traga de volta o que fui. Ouvi de sua boca que despreza quem sou ou, o que sou. Não quero competir para saber quem vale menos, quem por verme mais lamenta e rasteja. Mas saiba que sei quem sou por que sei que és. Se lembra? As vezes me esqueço e tenho um momento de paz... e quando acordo ouvindo o eco do passado não posso continuar. Você foi a maior surpresa que pude receber, do modo como não se espera mais pela chuva ainda a desejando por que dela depende seguir a vida.

Foi de propósito que aceitei o personagem por ti apresentado e dei crédito para que a ficção, e assim a vida imitando a arte, se tornasse matéria - cria-se mundos assim. Mas nunca se apaga a escrita de uma história, nem mesmo rasgando as páginas da pele. Sei que agora você sabe a diferença de não estar do meu lado, sabe que a vida reinventada por ti só teve fôlego por que seu hálito respirei. Todo azul do oceano estava nos teus olhos, desde sempre estive esperando e agora devo dizer que só restam lembranças e, às vezes, uma canção. Tu sabes manipular a matéria humana, sabes o quanto da dor e disso depreende o brilho que reveste sua armadura, no entanto está disposto a ganhar seus próprios jogos... eu? Eu não quero jogar, ganhar tão menos! O que tinha pra ganhar trago guardado e quando preciso não morrer, escrevo! Dizem que o que se escreve sobre o amor sempre será ridículo, tenho pena de quem não sabe como escrever o que sente. É amargo o sabor do orgulho, finalmente foi dele a vitória: um pensamento e basta, vem do orgulho a mão leviatã me avisar que morro, que seco, que pereço. O outro nome da força é poder, é vontade, é desejo. E se não for mesmo assim o paraíso estaria reservado apenas para quem nunca amou. Não há ninguém como a pessoa que aceitei como sendo tu. Sabes, e a árvore foi cortada e a canoa retirada do rio. Porém as margens se alargaram de tal forma que não avisto terra, não te revejo e nem a mim... e como poderia se não há ninguém como esse que, sábio menino, desceu de sua cruz e troça das moças rindo das flores, colhendo raios de sol.

Baltazar Gonçalves
Enviado por Baltazar Gonçalves em 02/06/2012
Reeditado em 15/09/2013
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