Meu pesar

Luto... estranha palavra, nunca tinha olhado para ela, vejo que seu significado é profundo. Ela é como um grito que sai da garganta de desesperados. Luto para continuar vivendo! Luto para parecer normal por fora! Luto para não desabar! Luto para manter a dor dentro de mim! Luto para segurar a realidade! Luto!

Tenho em mim um sentimento de pesar. O mesmo sentimento que se experimenta quando alguém bem próximo morre e ganhamos a consciência de que perdemos a pessoa e não mais a teremos nas situações cotidianas. Passamos a sentir falta daquele cafezinho, daquelas piadas, das brincadeiras que ela fazia... enfim, uma sensação de perda. Uma sensação de impotência seguida pela conformidade. Uma sensação de acomodar-se a perda, acomodar-se a ausência.

Experimento essa sensação quando contemplo o que sobrou de nós. Talvez tivesse sido grande e especial só para mim. Talvez eu tenha fantasiado uma relação de contos de fadas. Onde não há espaço para as pessoas más. Onde as forças do bem cooperam para ajudar a preservar algo que é único. Não sei, pode ter sido ilusão da minha mente criativa. O certo é que lamento. Lamento essa perda. Lamento que algo tão lindo e precioso só tenha existido em minha fantasia. O mundo seria tão melhor se servisse de palco para algo assim tão belo, tão rico, tão único e tão precioso quanto esse sentimento idealizado.

Meu pesar se perde as vezes, some em meio a uma outra ilusão criada: a de que estou melhor assim. Hoje me sinto mais segura do que antes. Sim segura , parece quase impossível de se acreditar que de tudo o que sobrou esteja a sensação de segurança, mas é que hoje por não ter nada mais de tão precioso para zelar, me sinto segura, não é preciso temer perder aquilo que não se tem mais. Finalmente posso dormir tranquila. Acabaram-se as preocupações. Era meio incomodo mesmo guardar esse tesouro, muita responsabilidade, parte da permanência dele dependia também de mim, e muitas vezes me senti incapaz de preservar a minha parte. Pode ser mesmo que eu tenha contribuído para que você não preservasse a sua. Assumo minha culpa, embora ache injusto me culpar quando o que eu mais queria era conseguir fazer a minha parte. Mas o certo é que deixei você se perder de mim. Não percebi que se afastava, não percebi que tinha tamanho senso de desvalor por algo que era-me tão caro. Outro sentimento bom que restou foi o egoísmo. Sim me tornei egoísta, não me importo mais tanto com você ou com seu sofrimento. Não me importo mais se te magoo. É como se tivesses me dado o direito de te magoar. Mesquinho, sim mesquinho de minha parte, mas ganhei essa faceta também. Sinto o choro subindo quando me recordo de minha inoscência perdida. Sinceramente na verdade gostava mais de mim iludida. Hoje me sinto bem, mais leve, mais normal. Mas na verdade mesmo, essa nova consciência me faz sentir cada vez mais o quanto tenho a lamentar. Que pena que a ilusão se foi. Que pena que não era real. Que pena que ...

Você também mudou, se não a seus próprios olhos, mudou aos meus olhos. Eu também posso tê-lo idealizado. Talvez minha mente tenha te criado, mas afianço-lhe que se criei, foi baseada em seu próprio discurso. Achei que realmente acreditavas no que me dizia. Hoje não sei mais do que és capaz. Perdi a noção de quem você é. Não posso mais dizer: ele não faria isso, confesso que me surpreendi. Não esperava isso de voce, achei que fosses confiável, que tivesse caráter, que fosses digno. Lamento também isso. O fato de vê-lo agora como um qualquer. Vulgar e comum. Igual a todos ou outros. Pode ser que o que eu procurasse só existisse nos livros. Mas queria tanto estar certa a seu respeito. Me custou muito confiar em ti, me custou muito acreditar que existias. Por muitos anos sonhei que não o havia encontrado. Pois te busquei minha vida toda. Quando te achei foi como se estivesse tendo um sonho bom, que se teme acordar. E eu acordei, realmente acordei e a realidade me bateu com uma violência traumatizante. Tudo bem; passou, acordei do choque. Estou vivendo a nova realidade, mas o certo é que lamento tanto. O lamento está se tornando menos frequente. Quase me acostumo a nova realidade. Mas as vezes, como agora a sensação de perda me abate e um nó se forma na garganta. As lágrimas me sobem aos olhos. Luto com todas as minhas forças para continuar te amando. Para não te querer fazer mal. Luto para continuar te sendo fiel. Fiel na amizade, fiel no respeito, fiel nos sentimentos. Luto para não arquitetar planos contra ti. Para não desejar-te o mal. Para não me rir de você quando sofres. Para não revirar os olhos quando se preocupas pelas bobagens que sempre te preocupou. Me lembro como era solidaria as suas loucuras , e mesmo como entendia seu egoísmo. Como conseguia compreender suas fraquezas. Hoje luto para ser empática com você. Luto para não me rir indiferente a sua dor.

Me dói não poder te amar, como eu te amava. Me dói não me importar como me importava. Me dói mantê-lo longe como a um estranho. Talvez seja melhor que você continues a pensar que nada mudou, que conseguimos superar mais esse percalço. Talvez seja bom que não tenha consciência de tudo que perdeu. Talvez nem soubesses o que tinhas e quero que fiques assim. Porque sofrerem os dois ? se amei por nós dois acho justo que eu seja também a única a ter esse sentimento de perda. Que seja eu somente a ficar de luto.

Rosahoney
Enviado por Rosahoney em 06/11/2012
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