Carta á Deus. Parte I

De: Fi Para: Todo Poderoso Deus, meu Pai.

Acabei de me deitar de bruços para escrever para Ti,, minha caneta desmontou. Algo sobrenatural? Sei lá. Sentei-me porque de bruços estava me incomodando. To olhando pro chão do quarto que acabei de limpar e já tem alguns lugares com sujeira, chão branco é uma merda viu! (com o perdão da palavra).

Agora decidi escrever no computador, prefiro mil vezes digitar, é mais rápido, eu prefiro. Sabe, Deus, eu tava lendo, agora pouco, um livro sobre o Raul Seixas, decidi dar uma paradinha porque estou gostando tanto do livro que será mais prazeroso prolongar a leitura, o livro é fino e eu acabaria de ler rápido demais.

Vou escrever para Ti agora sobre minha religiosidade, que creio que lhe interesse bastante. Nasci numa casa onde minha mãe e dois dos meus irmãos eram evangélicos. Quando criança eu ia à igreja, mas dormia a maior parte do tempo. Fui crescendo e contestando muitas regras e doutrina da igreja, então por anos me mantive “de mal” com a igreja, mas durante todo esse tempo de birra sentia muita falta de um consolo espiritual, lia livros espíritas, que eu gostava muito e ainda gosto, estive em algumas denominações diferentes e nada me satisfazia, nada me dava a paz que eu tanto procurava, e meu Pai, o senhor sabe que as coisas só iriam piorar.

Voltando mais no tempo, lembro – me muito de minha infância. Ah, eu era uma menina muito doce, bravinha e irritadiça muitas vezes, mas mesmo assim muito doce. Já se despontava em mim muitos sentimentos de bondade, justiça, sentimentos de humanidade e igualdade social. Um fato que me lembro bem e pode até parecer bobo (mas o senhor, meu Deus, meu Pai, sabe que não é), foi um dia em que eu estava brincando nu fundo do prédio com minhas amigas e soltei meus cabelos (que são bem lisos e grandes) para poder arruma - los, eu já estava toda descabelada devido a brincadeira. Quando uma amiguinha mais nova que eu, a Monique, mulata de cabelos crespos, olhou – me e decidiu soltar seus cabelos e balança – los como eu fazia com os meus, só um detalhe, o cabelo dela subiu e nem preciso dizer que não balançava, as outras meninas riam e pediam para que a Monique prendesse os cabelos e ela chorando dizia que queria ficar como eu, com os cabelos soltos e leves. Eu então ajudei a Monique prender suas madeixas e subi para meu apartamento, lá eu me tranquei no banheiro (o banheiro, o Senhor sabe, que foi o palco de muita tristeza, fantasia e alegria para mim, ah... quantas vezes clamei tua presença chorando por lá), chorei bastante e em meu pensamento vagava uma idéia, um inicio de ideologia, porque eu tinha os cabelos bonitos e a Monique não podia ter? Quando vi a Monique chorando senti que daria tudo o que poderia para que ela sentisse a felicidade de ter cabelos lisos, senti, talvez, que não era justo eu ter cabelos bons, lisos (Bom, que eu digo, é o que a sociedade acha meu Pai, pra mim isto não vale de nada) e a Monique não. Mal sabia eu que muitos pensamentos de justiça e igualdade tomariam conta de minha mente.

Fui crescendo, tendo em mente que eu devia ter um pensamento livre e até revolucionário, pensava eu que Deus estaria comigo sem eu precisar ir até “sua casa”, sempre via pessoas de outras religiões que eram bem felizes e pessoas de bem, então poderia eu seguir somente com minha fé. Sim isto é possível sim, mas eu nem sabia que minha fé e meus idealismos estavam confusos demais, e só o Senhor, meu Pai, sabia que eu ainda iria cruzar caminhos difíceis e ilusórios, pessoas cruéis e ilusórias. Deus, escrevi uma poesia, ou pensamento, sei lá, estes dias atrás e nele eu dizia que em minha infância e adolescência, toda vez que eu ficava triste e aborrecida com injustiças e até futilidades, clamava a Ti e me sentia no teu colo, acalmada e acarinhada por tuas mãos celestes e puras, porém conforme fui crescendo isso não ocorria mais e que nos dias de hoje não te sinto mais tão perto de mim. Hoje estou aprendendo meu pai, a duras penas, onde fui errando. Penso eu, que poderia ter sido uma boa irmã de Jesus, por favor, meu Deus não encare isto como algo pretensioso, eu jamais o seria, digo como uma boa irmã, em sentimentos que sei que de longe são parecidos, bem de longe, mas os são, e sei, Altíssimo, que tua luta, para me manter pura de muitas maldades e luxurias deste mundo foi grande, muito grande, acho até que estou de castigo por ter sido até um pouco ingênua e ter fugido ao que eu era (será que posso voltar a ser, depois de tudo?) Muito ainda se mantém em mim, tu sabes ó Todo Poderoso, mas o que se foi não se resgata mais. Será?

Pai, celestial, Altíssimo, preciso deitar um minuto, voltar a ler o livro do Raul, depois retorno esta carta a Ti, tenho muito a dizer e por carta me expresso bem melhor. Logo volto, não precisa ficar esperando Grandioso, novamente não quero parecer pretensiosa e pensar que me esperaria, mas também não quero ficar ocupando teu tempo.

Ass. Fi

Fi
Enviado por Fi em 03/03/2007
Código do texto: T399852