Para a minha amada irmã.

Difícil o recomeço quando um coração sangra de saudade e de dor. Eu sei que não é fácil. Nessa nossa vida tão atribulada, levamos horas para perceber o que deveríamos perceber em apenas alguns segundos.

Falar o quê para você irmã querida? Que palavras poderiam aplacar ou amenizar o seu sentimento despedaçado pela perda de um filho? Um filho jovem com futuro enorme pela frente.

Pensar em você me faz relembrar a nossa falecida avó que dizia que o certo e o natural das coisas seria o filho enterrar os pais e não os pais enterrar o filho.

O que é natural nos nossos dias de hoje? O que é natural em um mundo que vive encobertado pela neblina das aparências, do faz-de-conta e do artificialismo? Um mundo violento e repleto de ódio que desconsidera a vida como o bem mais valioso do universo. Matam por simples diversão, por suposta superioridade, por suposto acerto de contas.

Falta amor nesse nosso mundo minha irmã. E foi essa falta de amor que levou o seu filho cedo dessa vida.

Se houvesse amor não haveria um revólver e uma pessoa disposta a puxá-lo covardemente.

Se houvesse amor não haveria mortes por assassinato destruindo famílias, lançando na dor profunda pais, mães, irmãos, tios, sobrinhos, primos, amigos...

Se houvesse amor eu não estaria escrevendo essa carta para você.

É triste partilhar desse sofrimento porque eu sei o quanto você está arrasada. Mesmo sabendo que possui muitos amigos (nessas horas é que sabemos quem são os nossos verdadeiros amigos), com certeza a superação desse trauma vai demorar a acontecer. A sua ferida é bastante profunda e vai demorar alguns anos para cicatrizar. E cicatrizada vai ficar estampada em seu coração, não deixando que esqueça por completo a dor. Restará uma saudade teimosa e firme que jamais cessará.

Também sou mãe e me coloquei em seu lugar. Reconheço que foi terrível. Um filho é uma parte de nós. Uma parte importantíssima. Assim como o nosso corpo possui vários órgãos e cada um desempenha uma função diferente e primordial para conservar a nossa saúde, assim são nossos filhos. Nenhum filho é igual ao outro e cada um possui uma individualidade única que completa a nossa maternidade. Perder um filho e perder uma parte da maternidade. É se tornar uma mãe incompleta. Infelizmente, uma mãe parcialmente saudável. Continuamos funcionando, mas sem a completitude normal que todos os filhos dão a qualquer mãe.

Dia 12 de dezembro é seu aniversário. Primeiro aniversário sem seu filho. Estive pensando no que fazer e no que falar e decidi escrever essa carta. Comprarei um lindo cartão de aniversário e a remeterei junto com ele.

Espero que compreenda o fato de eu querer compartilhar a sua carta com outras pessoas e a publique no Recanto das Letras. Não é questão de querer expor a sua e a nossa dor. É questão de querer mostrar para as outras pessoas que também sofrem ou sofreram tragicamente pela perda de um ente querido que infelizmente a violência cruel e impiedosa não nos dá trégua.

Talvez eu queira a graça de poder enxergar um mínimo de luz no fim do túnel, uma chama mesmo que tênue de esperança em uma humanidade menos violenta e mais amorosa. Uma esperança utópica? Quem sabe, minha irmã. O que eu realmente espero bem no fundo do meu coração é que não precise escrever outra carta igual a essa para você ou para qualquer outra pessoa.

'In Memoriam' de meu sobrinho Jeimeson, jovem de 24 anos assassinado no dia 25 de novembro de 2012.

Até quando teremos que conviver com a violência que não deveria existir nem em filmes de ficção?