Cartas pra você I

Primeiro você me fez sair dessa cidade, você me fez ir para longe. Você mandou embora justo na hora que eu queria, aliás, que eu mais queria ficar pertinho de você, mesmo que separados pelo centro e alguns bairros campograndenses. Você me obrigou com seu riso engraçado à, sem querer, cansar ao viajar. Fui condenado a um dos piores castigos, umas das piores torturas: a viagem e a dúvida, respectivamente.

Em segundo lugar você, sem perder o dom da manipulação, me convenceu de que a suspeita que tinha a seu respeito poderia -finalmente- se tornar certeza. Perdeu seu fundamento. Porra, você está me fazendo mudar o estilo, você me faz mudar e me mudar. Quando foi que usei tais vocábulos? Quando foi que fiz perguntas tão diretas? Você conquistou, você ganhou, você encantou o meu ídolo e, assim, me levou junto (de graça). Na verdade, como veremos a seguir, você não quis me levar. Mais isso fica pra uma próxima carta.

Talvez você nem leia "essas mal traçadas linhas, meu amor". Você provavelmente não as lerá, mas não me é importante. Na realidade, importa, contudo isso não é a realidade e eu sou muito "macho" para assumir que me importo muito. O fato, porém, é que quanto mais te vejo, mais eu tenho motivos para não querer deixar para depois. Cada momento eu me apaixono -e odeio usar aquela palavra, acho que sou macho demais pra isso também... ou era- pelo jeito inocente.

E então, como o clímax de um longa qualquer, sem muito relacionamento com o restante do enredo, ainda que com precedentes, você some. Me dá mil motivos para pensar que morreu; e mais duzentos e trinta e duas razões para me convencer que sou forte e firme a ponto de fingir ignorar e deixar rolar. Tudo, ainda em analogia àquela metragem, passa rápido -às vezes em preto e branco- e dolorido. Não menos dolorido pois passa ligeiro, só é sagaz devido ao tamanho da espera.

Por fim, você volta e continua de onde havia parado. E já em ritmo lento eu insisto em manter a chama acesa, no entanto, você sutilmente assopra. Já não tenho mais nenhum controle sobre quem escreve agora. Somos eu e o escuro, você lá do outro lado. Parece sorrir, digo, rir. Alegria? Não! Desespero. Mas pra mim, é incomodante. Dói. Parece sarcástico, apesar de não sê-lo. E durmo, como você ousadamente mandou.

Atencioso e apaixonado,

Seu admirador explícito.