Anjinho sem asas

 

Anjinho sem asas


Não consigo esquecer nem por um instante aquela tarde de outono, tão fria e escura que mais parecia uma noite invernal, ou não... Talvez esse frio estivesse em mim, sinceramente, nem observei o dia! Mantinha os olhos vidrados na caixa que guardava minha jóia mais preciosa. Sentia a alma em queda livre nas profundezas amargas do abismo existencial...
Entre as tantas mensagens de condolência, olhares pesarosos, preces e lágrimas que rolavam por minha face saudosa, fluidos de paz dormitavam em seu corpinho lívido, envolto pelo perfume das flores que outrora não me fora aprazível, no entanto, se faz inesquecível em uma das poucas lembranças que tenho de ti.
Seus brinquedos intocados, e o chocalho silente permanecem no barcinho em luto; as roupinhas que bordei com tanto carinho estão temerosas na frieza do desuso, provocando lamento nas gavetas da cômoda planejada, branquinha com puxadores cor-de-rosa e detalhes dourados. Um capricho que saiu caro, e seu pai atendeu sem pestanejar!
Sonhamos juntos, e não fosse a tristeza que me abate agora, poderir rir um bocado recordando o dia em que a escada virou e ele caiu enrolado as cortinas em seu quarto; eu avisei que estava quebrada, mas ele é teimoso! Recostei na poltrona, dei boas gargalhadas e percebi seu incômodo com minha atitude, protestava com chutinhos indignados.

A cumplicidade era notável, sua predileção pelo papai me deixava orgulhosa, emocionada e um tanto enciumada.
Sempre tive certeza de que seria uma menininha, desde que o teste de gravidez deu positivo... Nossa menina! Nossa Menininha linda.
 
 
 

Desenganada pelos médicos, mas permaneci firme até o dia do parto, crendo em um milagre que bateu suas asas, escapou entre meus dedos e voou rumo ao infinito; desde então, convivo com esse vazio intrínseco deveras inexplicável. Meus seios reclamam sua falta com uma dor quase palpável, vertendo leite no pranto infindável.
Em meu coração a dormência intercala com a dolência , causando arritmia sombria e tremores em meu corpo debilitado pelo sofrimento que me toma cada vez que vejo teu retrato.
Minha criança nasceu linda, assaz perfeita, não fosse a ausência dos rins estaria aqui... Quentinha e vivaz em meus braços.
Seu primeiro e último chorinho está eternecido em meus ouvidos, pude ver seus olhinhos abertos, suas mãozinhas pequeninas tentando agarrar a vida por minhas impotentes mãos.
Antes de partir nos agraciou com um belo sorriso de despedida ao sentir os afagos do papai, logo minhas suspeitas se confirmaram... Antes mesmo de nascer amava esse bobo tanto quando eu.
Ah... Se pudesse trocar minha vida pela sua, não hesitaria! Infelizmente os anjos não adormecem, era madrugada quando levaram você para os braços de Deus, onde repousa minha princesinha, iluminando o céu com seu brilho de estrela! Te amo!
 
Christinny Olivier
Enviado por Christinny Olivier em 16/10/2013
Código do texto: T4528740
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