palco

“...peguei em mim mesmo e sacudi-me… esperei que saísse algo que estivesse a mais… mas não caiu nada de mim… continuei a sacudir e ouvi algo indefinido… era como que uma recordação dentro da minha alma ou do meu coração… como saber?... peguei então em ti e despi-me de ti… tirei-te de dentro de mim... coloquei-te ali ao meu lado e olhei para ti... foi nessa altura que me senti nu... mas não consegui vestir-te de novo... já não cabias dentro de mim... que fazer então?... sonhos destruídos, caminhos não percorridos ou teriam sido mesmo percorridos?... como é que não reconheço se os percorri ou não?... confusão dentro do meu ser... sacudo as memórias mas a força centrífuga da saudade mantêm-nas aqui dentro... fico atento... espero olhar em frente, não me sentir demente, talvez solidão somente… eternamente aqui ao meu lado presente... arrumo os fatos que me vestem a alma e com calma procuro novas roupas que me tapem a nudez que me enregela o corpo, como nado morto, triste e absorto... quero ressuscitar, quero simplesmente me transformar, vestir-me de novo, olhar para o espelho e sorrir, cantar, bailar… pegar em mim e voltar a caminhar qualquer que seja o caminho que tenha ainda de palmilhar... é que os pés, mesmo de barro, ainda são os mesmos… cansados de andar, é certo, mas que sempre me sustentaram ao alto nesta vida, tremenda e profunda como um palco...”

Joaquim Nogueira