4ª CARTA

“O meu passarinho morreu.
Peninha já estava bem velhinho, era um canarinho da terra. Dormia no meu quarto, na sua gaiolinha que mandei fazer com tanto esmero, e de manhã ia pra varanda ver o sol nascer.
Eu gostava muito dele, imagina, tantos anos alegrando a minha vida, o amarelo-ouro de suas penas, a cantilena harmoniosa que embalava os meus dias... Agora o silêncio toma conta de tudo, e o vazio da gaiola se estende por toda a casa.
Resolvi não retirar o preguinho na parede do meu quarto, que sustentava a sua casinha de bambu-da-china, e no lugar em que ele ficava na varanda pendurei um arranjo de flores.
Depois que perdi o meu marido, Peninha era a única motivação da minha vida. Agora estou completamente só. Viúva e sem o meu Peninha.
Desculpe e um beijo.
Isaura”.
 
Não sei por qual dos dois expressar a minha pena: por você ou pelo seu Peninha. Em todo caso, Peninha ganhou uma gaiola nas nuvens e já canta para os anjos.
Por que você não aproveita para se inscrever em um curso de canto orfeônico? Fazendo parte de uma agremiação sob o comando de Orfeu, quem sabe Peninha ouça os seus lamentos e responda, de lá, com os seus acordes dobrados?
Você também não precisa se desvencilhar da gaiolinha que costumava ficar na varanda para Peninha ver o sol nascer. Busque um pouco de conforto ao entardecer de cada dia, à hora do sol poente - que é o símbolo do descanso -, e pendure a gaiola com vistas para o astro que morre. Como você sabe, os orientais creem no renascimento a cada alvorecer, não é verdade?
Dou total apoio à sua ideia de não retirar o “preguinho” na parede do seu quarto. Fiquei sabendo que o canário-da-terra vive em média 8 a 10 anos. Em homenagem a Peninha, sugiro que você pregue outros 8 ou 10 pregos na sua parede, de modo que a cada um dos buracos abertos fique dedicado o seu eterno amor aos anos de vida dele. E mais ainda: a sua maternal dedicação ainda poderia perpetuar-se com uma franca homenagem aos aniversários de luto do Peninha, quando um novo buraco na parede fosse aberto ao completar-se mais um ano da perda, e na progressão de tantos quantos fossem os anos de sua vida.
E não vá deixar sua viuvez se transformar em uma tragédia. Faça novas amizades e procure um novo amor que logo você ganhará um outro passarinho.

Abraço,
Dr. Golden.