6ª CARTA
“Vou logo dizendo: ando irada! Não sei o que acontece. Faz tempo, perdi a paciência pra tudo. Começa às 6. O despertador é uma tortura, mas não há outro jeito de acordar. O espelho é contra mim, a pasta de dente custa a deixar o tubo, a água da torneira é gelada e vira volta o papel higiênico está sempre no fim. Será que é Karma? E o que dizer da condução pro trabalho? Ônibus lotado, gente se esfregando, trânsito maluco e um chefe chinfrim me esperando.
Voltei a morar sozinha. Não dá pra dividir meu apê. O Fábio foi o último. A Sabrina foi a penúltima. O pior é que nem mesmo sozinha eu fico em paz. Moro de frente pra uma Avenida que não dorme nunca, o barulho da noite, lá fora, me tira o sono. O automático do ar condicionado me desperta a cada três minutos, mas também não dá pra desligar. Agora as paredes estão me incomodando. O apê é pequeno demais, eu me sinto apertada e sufocada. Quando eu saio um pouco quero voltar logo. Mas quando volto quero sair. Só não vou morar no mato porque fica longe do trabalho.
Mas e aí? Me conte as novidades!
Até,
Fernanda.”
“Vou logo dizendo: ando irada! Não sei o que acontece. Faz tempo, perdi a paciência pra tudo. Começa às 6. O despertador é uma tortura, mas não há outro jeito de acordar. O espelho é contra mim, a pasta de dente custa a deixar o tubo, a água da torneira é gelada e vira volta o papel higiênico está sempre no fim. Será que é Karma? E o que dizer da condução pro trabalho? Ônibus lotado, gente se esfregando, trânsito maluco e um chefe chinfrim me esperando.
Voltei a morar sozinha. Não dá pra dividir meu apê. O Fábio foi o último. A Sabrina foi a penúltima. O pior é que nem mesmo sozinha eu fico em paz. Moro de frente pra uma Avenida que não dorme nunca, o barulho da noite, lá fora, me tira o sono. O automático do ar condicionado me desperta a cada três minutos, mas também não dá pra desligar. Agora as paredes estão me incomodando. O apê é pequeno demais, eu me sinto apertada e sufocada. Quando eu saio um pouco quero voltar logo. Mas quando volto quero sair. Só não vou morar no mato porque fica longe do trabalho.
Mas e aí? Me conte as novidades!
Até,
Fernanda.”
Novidade mesmo eu não tenho, Fernanda, mas também não sei se adiantaria alguma coisa.
Não esquenta não, minha amiga, que a raiva é inerente ao ser humano. O próprio universo, no começo de tudo, explodiu, não é mesmo? Se a poeira cósmica fosse calminha o que seria do Big Bang?
Faz um teste: compra um reloginho de alarme super silencioso, do tipo que às 6 da manhã te desperta com uma musiquinha clássica, muito suave. Chegando atrasada ao trabalho, como é de esperar, quem começará mal o dia será o teu chefe chinfrim. Caso percas o emprego, pega de volta o despertador.
Mas que estranheza é essa de achares que o espelho é contra ti? Estivesse ele a favor e tu o verias pelo lado do aço! Ainda no banheiro, me parece que a pasta relutante anda sem coragem de chegar-te aos dentes. Conversa com ela, diz que não irás (olha a raiz da ira!) mordê-la, e aproveita para renovar o estoque de papel higiênico.
Tu tens razão: o trânsito é muito louco e a condução para o trabalho, estafante. Aconselho a que compres um automóvel, mas procura sair de casa para o serviço ainda de madrugada e voltar depois da meia noite, quando não há quase ninguém nas ruas.
Voltaste a morar sozinha? Que ótimo! Dás um ótimo exemplo ao te preocupares com o próximo!...
Então até as paredes do teu apê te incomodam? Elas te apertam, te sufocam? Por que não as derruba? Faz um cômodo único, espaçoso, um projeto inovador nesse teu 904! Quem sabe o novo layout não te "empurra" pra cima? Mas cuidado com o 1004.
Tu dizes: “quando eu saio um pouco quero voltar logo. Mas quando volto quero sair”. Queres um conselho? Dorme na soleira da porta, que esse limite anulará a tua ilusão de ir e vir...
E antes que eu esqueça: desculpa a carta na segunda pessoa. É que a primeira não aguentou...
Abraço,
Dr. Golden.
Não esquenta não, minha amiga, que a raiva é inerente ao ser humano. O próprio universo, no começo de tudo, explodiu, não é mesmo? Se a poeira cósmica fosse calminha o que seria do Big Bang?
Faz um teste: compra um reloginho de alarme super silencioso, do tipo que às 6 da manhã te desperta com uma musiquinha clássica, muito suave. Chegando atrasada ao trabalho, como é de esperar, quem começará mal o dia será o teu chefe chinfrim. Caso percas o emprego, pega de volta o despertador.
Mas que estranheza é essa de achares que o espelho é contra ti? Estivesse ele a favor e tu o verias pelo lado do aço! Ainda no banheiro, me parece que a pasta relutante anda sem coragem de chegar-te aos dentes. Conversa com ela, diz que não irás (olha a raiz da ira!) mordê-la, e aproveita para renovar o estoque de papel higiênico.
Tu tens razão: o trânsito é muito louco e a condução para o trabalho, estafante. Aconselho a que compres um automóvel, mas procura sair de casa para o serviço ainda de madrugada e voltar depois da meia noite, quando não há quase ninguém nas ruas.
Voltaste a morar sozinha? Que ótimo! Dás um ótimo exemplo ao te preocupares com o próximo!...
Então até as paredes do teu apê te incomodam? Elas te apertam, te sufocam? Por que não as derruba? Faz um cômodo único, espaçoso, um projeto inovador nesse teu 904! Quem sabe o novo layout não te "empurra" pra cima? Mas cuidado com o 1004.
Tu dizes: “quando eu saio um pouco quero voltar logo. Mas quando volto quero sair”. Queres um conselho? Dorme na soleira da porta, que esse limite anulará a tua ilusão de ir e vir...
E antes que eu esqueça: desculpa a carta na segunda pessoa. É que a primeira não aguentou...
Abraço,
Dr. Golden.