12ª Carta

“Meu amigo, me responda, por favor: Carlos Henrique tinha que aparecer agora?
À época foi maravilhoso. Éramos muito jovens, eu ainda no Colegial e ele se preparando para os exames da Marinha do Brasil. Adolescentes, aprendemos juntos a lidar com as coisas do amor, a paixão, os dissabores e tudo o mais que a vida tinha para nos mostrar. Era uma coisa pra toda vida, assim pensava eu e, estou certa, ele também. Mas a vida segue por caminhos que não conhecemos e às vezes os nossos passos procuram outros rumos. Ele foi aprovado nos exames, ingressou na Marinha, fez carreira, as viagens passaram a ser constantes, quase não nos víamos mais e o amor, que parecia eterno, acabou.
Bem, passou, passou. Hoje sou casada e tenho uma família estável.
Aconteceu que há mais ou menos um mês encontrei Carlos Henrique na academia de ginástica do nosso bairro. Ele veio passar as férias na casa dos pais com a mulher dele. Esse primeiro reencontro foi bom, falamos de casamentos, famílias e como ainda somos jovens. Os dois encontros seguintes, ainda na academia, reacenderam chamas que apenas dormiam. O terceiro encontro e os seguintes já foram no motel. Mas as férias acabaram e ele voltou com a mulher para a Base da Marinha. Eu descobri que nunca deixei de amá-lo, mas em nossas conversas recentes ele não demonstrou a mesma paixão. Disse que ainda gosta de mim, que nossas vidas tomaram rumos diferentes e prometeu voltar. E como fica a minha vida? Espero as próximas férias? Não consigo esquecê-lo, sei que minha família não merece isso, mas e eu? Não mereço ser feliz?
Kátia”.
 
Kátia, o seu problema não é insolúvel. Às vezes precisamos jogar tudo no oceano e esperar que ele dissolva a encrenca. Digo de forma figurada, você não precisa se afogar. Essa solução é rápida demais, não teria graça nenhuma e seria muito salgada. Espere por uma resposta natural. Por isso, aproveite esse vento em popa no mar que você escolheu, assim a paixão vai matá-la aos poucos, usando os remos e não os motores do desespero. É uma viagem longa, porém mais proveitosa.
Na carta, você deixa claro que o seu amor não é mais correspondido. Penso que essa paixão unilateral tenha pesado mais para bombordo e adernado o barco até afundá-lo. Ou então Carlos Henrique, por causa de suas viagens marítimas, acabou mesmo enjoando... De qualquer forma, tenha a certeza de que tudo isso passará: você para um lado e ele para o outro. E o barco voltará ao equilíbrio.
Mas se você padecer do mal da sofreguidão, do tipo de doença que leva a pessoa a não esperar pelo melhor tempo, também pode ingressar num curso intensivo de mestre Arrais e partir a toda velocidade contra a sua concorrente, mas não faça isso contra a corrente. Em todo caso, vá com calma, velas içadas e mantenha acesa a chama dessas velas. Se preferir, aceite o compromisso de ‘amor nas férias’: quer melhor do que passar as férias no paraíso?
Caso tenha optado pelo curso de mestre Arrais com pretensões de invadir a Base da Marinha, certifique-se, antes, de que Carlos Henrique não tenha sido transferido para o Distrito Federal. Confirmada a transferência dele, minha cara, talvez o seu destino seja mesmo viver qual cisne branco, em noite de lua, e ficar no Porto a ver navios...

Boa sorte,
Dr. Golden.