"O último suspiro, Manuel.
(uma carta a Manuel Bandeira)



Todas as coisas, todas as coisas que gostaríamos de fazer e falar e sentir, mas não fazemos nem falamos nem sentimos, embora em nossa garganta esteja a ânsia de nossas angústias, um grito, quase que mudo, sem direção, cego, mas sentido por todos os cantos do mundo e em cada ouvido humano, tudo que guardamos em nossos corações, e, que, nunca preencherão o infinito de nossas almas, nos fazem sentir um pouco de esperança, como naquele seu poema, aquele, aquele [não me recordo seu nome...], é que hoje eu acordei após dormir por 12h ininterruptas, e ao abrir os olhos, o sol fez arder minhas pupilas, o vento, era frio, perturbadoramente frio, e então, Manuel, eu me perguntei: por que devo me levantar? Que diferença fará em ficar aqui, deitado, ou pisar os pés no chão?Sabe, hoje entendo tua fuga, digo, para pasárgada, eu sei e você também sabe, que nesta vida é pouco ser feliz, mas Manuel, eu escolhi, e nem me pergunte o porquê, colocar os pés no chão e me levantar da cama, meu corpo doía, sentia-me muito cansado, contudo, eu fui até a janela e olhei o tempo lá fora, para minha surpresa, havia flores no quintal do vizinho, flores, Manuel, flores!! Eram belíssimas flores misturando-se ao verde e ao vermelho, esse vermelho, eram umas sementinhas que caíram do pé de sei-lá-o-quê, olha, Manuel, eu posso não saber de tudo, posso não ter seu talento para escrever poemas, principalmente falando de minha infância, posso até ser meio triste, às vezes, mas há algo na vida que não nos deixa desistir, está lá, incutido em todas as coisas, seres, lugares, e é como a poesia, entende? Todas as vezes em que vejo aquelas sementinhas vermelhas, me recordo de quando eu era garoto, minha mãe me levou na casa de uma amiga dela, ficava no meio de uma escada longuíssima, cercada de árvores e flores, e ela, a escada, estava coberta dessas sementinhas vermelhas, foi lindo, havia um acolhedor silêncio que permeava todo o local, um cheiro, que fica no ar após alguns minutos de chuva, nos degraus, sementes e pedaços de flores deixados como prova de que ali habitou e ainda habitava vida, tudo isso são lembranças, lembranças de um tempo que se passou, não volta, está presente somente em mim agora, e esta cena, Manuel, nunca saiu de minha cabeça, você pode achá-la tola, sem sentido nem propósito, mas é uma das cenas que guardo comigo para lembrar que há beleza em tudo, meus olhos naquela época podiam até imaginar coisas além do realmente visto, mas é essa a beleza, nunca esteve nas coisas em si, esteve sempre em nós (...) Manuel, hoje sou adulto, coisas como estas me passam alheias, eu sei, hoje faço versos com minha tristeza e amargura, e, assim como você, eu também sou tudo aquilo que não fui, todas as coisas das quais sonhei inocentemente enquanto sentia o cheiro das folhas verdes trazido pelo vento lá em casa, são tantas as coisas, essas coisas que alimentamos diariamente em nossos corações, confundindo o incolor do mundo externo com o colorido de nosso interior, o mundo nunca espera que superemos nossas dores, mas ao menos...ao menos eu gostaria de ler um poema teu essa noite, se eu tivesse o poder de criar minha pasárgada, nela você moraria, seria eterno, lhe reviveria para mais um poema sobre a infância, sobre a vida, a morte, o amor, um poema, Manuel, só mais um poema, só mais um suspiro, o último."

Um Rapaz Meio Estranho 

Uma gentileza e tanto. Muito obrigada!
Li em seu perfil. Pedi e fui atendida. Só gratidão.

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Um Rapaz Meio Estranho
Enviado por Maria Madalena de Jesus Gomes em 14/02/2019
Reeditado em 14/02/2019
Código do texto: T6574841
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