Uma carta minha, para mim.

Querida Anaís,

Nós tínhamos que descobrir o amor, porque por hora só o sentíamos.Faltava, porém, algum nível de consciência que não nos prejudicasse ao sentir.Talvez não houvesse mesmo uma fórmula para aqueles tempos, e mesmo se tivesse uma, nós não acreditaríamos nela.Hoje com os nossos corações desfeitos, cheios de uma melancolia terrível, estamos fazendo um caminho mais tortuoso que exige de nós certas humildades internas.

A primeira coisa é a liberdade, o libertar-se para que assim pudéssemos não nos emaranhar às coisas, nem elas a nós.Essa liberdade tão custosa a quem ama, porque quem ama não gosta de libertar. Esse aprendizado tão difícil e pouco gentil, é o que nos corta o coração ver enlaçar-se em coisas que realmente são sensatas a se fazer.

Outra coisa são os ressentimentos.Aqueles sentimentos que não podendo ganhar vóz em nós, vão fermentando e crescendo na estante de nossos pensamentos.Isso tange a liberdade também, porque ali moram perigos igualmente insensatos.Angústias que não valem mais à pena ter, porque quem as causou fomos nós, e aos outros nada há de responsabilizar.

Uma outra coisa é aprende a amar na incostância e na não-resposta.Quando não tivermos nada e esse nada for o tudo que podemos ter, que ele nos contente. Não me pergunte como, pois eu não sei, mas que seja como uma prece.Que seja atendida e assim possamos seguir acreditando até mesmo na coerência que não vemos.

E o apego, esse veneno que gostamos de tomar. O apego que temos pelas pessoas e coisas em nossas vidas.Gera tanto sofrimento, tanta tristeza e não aprendemos nada sobre apego.Ainda guardamos, nos apegamos a fios de cabelos, a lenços amarrotados e a certas coisas ditas em épocas bem distintas da de hoje.Achamos que essas coisas são uma promessa de que essas pessoas durarão em nossas vidas e terão para conosco, um código de fidelidade.Vamos em vão pedir a elas que não nos abandonem, que não deixem nossos sonhos cair por terra.Mesmo quando os indícios disso são irrefutáveis, nos agarramos aos tecidos puídos que não sustentam mais os nossos sonhos.Isso sim é apego.

Não podemos levar tudo conosco. Não podemos abraçar a tudo e pedir que esse tudo seja presente na mesma escala que antes.Tudo muda.Não queremos que mude, porque foi belo enquanto durou, mas se não muda, não se vive.A vida é isso: Constante mudança.

Não queremos ser esquecidos. É horrível o esquecimento, mas infelizmente, temos a vaidade de não desejar que o esquecimento aconteça.Não queremos que nossos antigos amantes, amem outras que não nós. Queremos ser eternos por onde passamos, na vida que marcamos e compartilhamos.

Temos que aprender a não querer essas coisas e nem outras.Temos que aprender a deixar ir. O que se viveu, se viveu e pronto.Por mais que doa, nada há para se fazer.Por que essa intransigência com Deus?Por que dizer a Ele quanto tempo algo deve durar e como deve durar?

Se temos esses lampejos de lucidez trabalhemos em pról disso.

Você que está cheia de medos e sofrimentos, eu que estou cheia de medos e sofrimentos, vamos combinar uma coisa entre nós que somos filhas de Deus: Vamos deixar liberto, vamos deixar ir e desapegar-nos, porque nem eu e nem você podemos levar tantas coisas assim. Vamos deixar compreendido e aberto.

Sei que é difícil para você e para mim, mas vamos fazer assim.Vamos fazendo assim.Vamos tentando assim, e silenciar, porque isso é bom.

Com todo respeito por você e por mim,

Anaís.

Anaís
Enviado por Anaís em 18/09/2007
Código do texto: T658005