Carta de Despedida à minha Primeira Mulher

Estou serena. Uma levíssima melancolia me perspassa como uma brisa quase imperceptível, se não fosse por sua doçura.

Você está incrivelmente longe de mim. Tanto quanto se nunca houvesse existido. Estou de novo comigo mesma. Você foi só uma das tantas pessoas que passaram pela minha vida mas não quiseram permanecer.

Você foi como o vento refrescante num dia insuportávelmente tórrido de verão. Você foi um alívio passageiro. Fugaz e fugidio. Quase irreal, se não houvesse tocado minha pele. Como uma brisa no Verão, como um perfume na Primavera, como uma chama no Inverno, como o dourado no Outono. Como eu renascendo de mim e me descobrindo nela. Você foi uma linda poesia inacabada, antes que os versos perdessem sua rima. Você se foi ou nunca existiu?

Em meus dolorosos enganos pensei ter sido o encontro de dois desejos mas não. Foi o encontro de um desejo com um sonho. De meu sonho com sua fantasia mais bela, mais cara e talvez por isso mesmo, mais inatingível. Mas enquanto o desejo se extingue, o sonho se alimenta, pulsando tanto quanto no momento perdido. O desejo morre e o sonho se eterniza. É como embalar ternamente com as mais lindas canções de ninar uma criança já há muito tempo morta. E enquanto o desejo não é nada nunca além dele mesmo, o sonho se confunde com si mesmo e não sabe se se chama Fantasia ou Amor. E assim, sem saber o que é ou como se sentir, o Sonho sofre, e torna-se Dor. Sangra em forma de lágrimas e esvai-se em perguntas tolas, já que suas respostas não passam de certezas antigas. O Sonho é cruelmente açoitado pela Solidão e pelo Vazio, cada qual o mutilando cada vez mais, até que dele nada mais reste.

E assim o Sonho, sem saber que é um sonho, morre.

E dessa forma se acabam todas as histórias que poderiam ter sido mas não foram, dessa forma a poesia perde sua essência e permanece inacabada, mutilada dela mesma.

Do mesmo modo, os corações tornam-se sepulcros onde enfim são enterradas todas as ilusões, enquanto os olhos reluzem como brilhantes lápides, lembrando amores que já se perderam no fosso da alma; e anunciando sua presença inexistente.

É assim que um cadáver sepulta seu morto. É assim que me separo de você. Pelo instante de eternidade agradeço. Pela eternidade dos instantes lamento. Assim você veio e assim você partiu: como uma brisa, que por ser brisa, por si só já é insustentável. Ai dos tolos, tentando reter a brisa com os dedos, pois querem para si o que não lhes pertence. Ai de mim, que atrelei meu coração à sua lembrança, e agora que até ela se distancia, também me afasta, cada vez mais, pra longe de mim.

Um espectro de alma é o que me reflete o espelho. Foste. E consigo levaste o calor do meu corpo e a alegria de meu espírito. A primeira vez que te vi sorrias, a última vez que te vi sorrias. As lágrimas eram só minhas. Foste. E como poderei eu sorrir sem o que levaste de mim? Agora que és Saudade tornaste um fantasma. Deixaste-me como o perfume que abandona a rosa. A Rosa, separada de seu Perfume, seu maior tesouro, despe-se de suas próprias pétalas e fenece, consciente de que fora uma rosa mas totalmente esquecida de sua beleza. Assim morrem as rosas.

Assim morrem os amores.

E assim a vida finalmente retorna ao normal...

Lady Loen
Enviado por Lady Loen em 29/09/2007
Código do texto: T673719