Resposta aos Pensamentos Quase Póstumos de Luciano Huck

Caro Luciano Huck,

Tive a oportunidade de ler seu texto publicado no jornal Folha de S. Paulo, na seção chamada Tendências/Debates, e, observando alguns deslizes no conteúdo deste, resolvi escrever-lhe para discutir alguns fatos.

Conheço seu trabalho na televisão. Apesar de não o assistir com muita freqüência, já tive a oportunidade de ver alguns quadros. Confesso que fiquei surpresa ao deparar-me com um texto assinado pelo senhor. Por curiosidade, o li com muita atenção. Concordo em alguns pontos com seus argumentos. Exemplo disso, penso que seja direito legítimo de qualquer cidadão - não importando credo, cor ou classe social – ficar indignado por ter sido vítima de uma violência urbana e expor isso. Seria melhor ainda se todos tivessem essa mesma oportunidade. Também concordo que está na hora de discutirmos segurança pública de verdade. Mesmo sendo criticada por muitas pessoas por pensar assim, acho que a polícia deve adotar medidas rígidas em relação aos bandidos. Em muitos países funcionam, aqui também tem boa chance de funcionar. Os criminosos têm que começar – e já passou da hora – a realmente temer a polícia e a lei.

Apesar destes pontos de vista parecidos, acho muita pretensão do senhor achar que, se tivesse perdido a vida, deixaria um governador envergonhado e um presidente em silêncio. Se um governador corrupto que é tão desonesto com o povo que o escolheu como representante não tem vergonha alguma disto, imagine se se sentiria culpado por, usando suas palavras, apenas uma pessoa que faz parte das estatísticas da violência em São Paulo. Imagino também que o presidente, como em situações muitos piores do que esta, ignoraria o fato, publicando apenas uma nota que seu assessor escreveu para a imprensa. Depois disso, cairia no esquecimento.

Acredito que o senhor assista aos jornais e seja esclarecido de que nosso país enfrenta uma grande violência nas ruas, principalmente a cidade de São Paulo. É, no mínimo, ingenuidade pensar que qualquer um possa andar com um relógio de mais de 10 mil reais na rua, tranqüilamente. É triste, mas é a realidade. Assim como é ignorância ver que assaltos a mão armada existem de verdade apenas quando isso acontece com você. É até meio estúpido pensar que esse fato não é certo só agora, tempos depois que virou parte do cotidiano dos brasileiros. Também é fato que abolir o carro blindado por filosofia, em nosso país, é uma atitude não muito bem pensada. Pode não ser isso que o senhor queira para sua cidade, mas, infelizmente, não temos o luxo de querer. Enquanto isso não for mudado, é a nossa real situação. Não vou ser hipócrita e dizer que a população se acomodou. Eu me acomodei. Não vejo nada com grande eficácia que eu possa fazer para reverter a situação, creio que o senhor também não.

O senhor ainda diz que faz sua parte e que deixa o país mais bacana, divertindo a população na TV e fazendo um trabalho social em sua ONG. Não conheço o trabalho da última, mas em relação à TV, penso que a educação vem primeiro do que a boa diversão. Acredito que a chave-mestra seja a educação de qualidade para que o Brasil seja um país melhor e desenvolvido. Gostaria de, com essa oportunidade, dar uma dica ao senhor: seria muito bom ver o trabalho de sua ONG na TV, divulgar esse papel social tão importante, como o senhor diz. Muitas pessoas se sentiriam mais esclarecidas e reconheceriam esse seu lado mais envolvido com a sociedade menos privilegiada.

Depois da exposição de minhas opiniões, espero que o senhor reveja alguns conceitos. Não que vá mudar sua vida, mas certas noções básicas têm que ser inseridas no pensamento e no dia-a-dia de cada um de nós, brasileiros. Desejo-lhe também uma boa vida e que não saia muito de seu mundo, onde a realidade não é tão real assim. É melhor ficar por aí, com sua mulher e seus filhos, porque a vida aqui fora não é fácil, não.

Gabriela Gusman
Enviado por Gabriela Gusman em 22/10/2007
Reeditado em 01/11/2007
Código do texto: T705530