Ainda dói

É estranho, mesmo depois de tantos anos, eu querer que você se separe? Não, "querer" é um verbo forte demais, porque faz parecer que é algo que eu penso todos os dias e coloco nas minhas preces matinais. Não é, mesmo.

Mas, tem uma partícula de mim, menor que um átomo, que ainda tem esperança de te ver sozinho. Acho que faz parte da vontade de poder te abraçar sem culpa e dizer que te perdoo, ou de ouvir de você as coisas que eu sei que existem aí dentro, mas não fazem mais sentido algum.

Você é feliz.

Eu sei que é porque te conheço. Eu vi esse homem florescer e desabrochar em todos os sentidos, desde o começo. E é o que me dói mais. Acho que grande parte tem a ver com o fato de que eu sou miserável sem você, com exceção das vezes nas quais fui completamente feliz. Já faz algum tempo, mas mesmo a minha lembrança mais radiante depois de você não se compara às que tive do teu lado.

Pior é que sei que é só meu cérebro maquiando todas as brigas, os comportamentos tóxicos, os ciúmes descabidos, o controle abusivo, a desconfiança, as mentiras... Ele levou a sério aquele dito popular: leve só o que foi bom. É tão injusto... Porque sei que, se tiro tudo de ruim, eu nunca vou conseguir seguir adiante. Nossas lembranças são aquele meu lugar seguro na mente, pra onde eu vou quando o mundo desaba a minha volta e até nos meus sonhos, você é mais presente do que a maioria das pessoas que conheço.

Então, te procuro no mundo real... E te encontro tão feliz.

É bom te ver feliz. É bom saber que não se arrependeu. É bom saber que está no caminho que escolheu... E que ainda não olha para trás.

Se algum dia olhar, porém, eu espero não estar tão distante a ponto de não poder me ver, no final daquela velha bifurcação na estrada, onde tudo terminou. Eu sigo no exato ponto no qual me deixaste e ainda te vejo, quase desaparecendo, quase um borrão, mas ali, presente. Não sei por quando tempo, de verdade. É cada vez mais difícil lembrar de você com exatidão. Mas, eu sempre esperava você desaparecer de vista para continuar minha vida quando estávamos juntos: até você virar a esquina, eu te esperava debruçada no peitoril da varanda e, só então, seguia minha rotina.

Enquanto eu ainda conseguir te ver, fico, permaneço.

E quem sabe um dia... Você olhe para trás, como tantas vezes fez, sorrindo com teus dentes separados... E acene de volta pra mim.

Ladra de Tinta Seca
Enviado por Ladra de Tinta Seca em 20/12/2021
Reeditado em 20/12/2021
Código do texto: T7411781
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