Eu te vi

01 de junho, 14:46

Querido x,

Eu te vi.

Hoje é quarta-feira e eu sei que você precisa pegar o ônibus em um ponto perto do meu. Tenho tentado fazer coisas diferentes para não lembrar disso, mas não consigo. Toda quarta-feira eu lembro disso umas cinco vezes – se não mais. Eu desço do ônibus, ouvindo alguma música do Creed bem alta, para tentar não escutar nem os meus próprios pensamentos.

Mas, hoje, eu não consegui. Eu estava caminhando em direção a minha casa, quando te vi. Meu coração quase saiu pela minha boca.

Você estava descendo a avenida, no sentido contrário ao meu, perto daquela loja que fomos buscar umas blusas que seu amigo tinha comprado, uma vez. Seu cabelo estava todo bagunçado e, com toda certeza, posso afirmar que você nem tivesse o lavado.

Você estava usando uma blusa preta, igual estava vestindo na última vez que nos vimos. E andava do seu jeito meio “pulando”. Eu não sei explicar o seu jeito de andar, mas é um tanto quanto peculiar e eu reconheceria há quilômetros de distância.

Quanto mais perto você chegava, mais a minha barriga se revirava. Eu não consegui nem pensar no que te diria. Todas as palavras do universo sumiram.

Eu só conseguia repetir o seu nome mentalmente várias vezes. E o fato de você ter vindo me procurar. Que você não tinha desistido de mim. Que você também sentia a minha falta, como você tanto falava.

Que você iria me abraçar, beijar a minha cabeça e pegar no meu rosto, como você sempre fazia. Que iria dizer o quanto eu estava linda, mesmo que estivesse com um moletom vermelho, o cabelo todo bagunçado, os óculos sujos e os olhos inchados. Que eu iria rir e te dizer que não estava nada. Que iria te mostrar uma espinha e você iria fingir que não estava vendo, mesmo se ela fosse gigante e gritasse para alguém estourar. E logo depois, você iria me contar sobre alguma história trágica do seu dia.

Então você chegou bem próximo a mim.

E você tinha cabelos pretos. Uma mochila verde. Uma cara fechada. Sem nem um resquício de sorriso.

E, com certeza, aquele não era você.

Passei pelo homem, muito parecido com você, e quando virei a esquina, chorei. Eu não sei por que pensei que você ficaria me esperando e viria falar comigo. Não sei por que ainda tenho essa esperança acesa dentro de mim.

Eu não sei como quebrar essa lâmpada. Eu queria arremessar ela tão forte que os cacos de vidro virariam pó.

Mas, essas coisas continuam acontecendo. Eu ainda desço do ônibus, toda quarta-feira, com a esperança de que você vai estar por ali. Esperando.

Como eu coloco na cabeça que você não vai voltar?

Elena