Carta à ninguém 18.06.2022

se perguntares como foi meu dia, direi que depende, direi que varias, se estou no acontecimento dos teus braços, se estou na capital morte da rotina, se estou inerte às sensações de revolta & indignação quando muito tempo a pensar e a analisar a situação de nuestra patria, de nuestra tierra.

a revolta e a indignação — se muito tempo sentidas — nos passa a ser indiferente?

as soluções são muitas, as soluções são poucas, as soluções são... quais?

direi que o meu amor tem sido uma mistura de imaginação erótica, escassez & tédio, automatismo & anestesia, e estrelas apagadas.

penso se o amor ainda cabe nos dias, assim como a minha leitura há muito pausada.

mas são sempre as notícias, as corrupções, as tragédias, os acidentes, a insegurança neste país em que vivemos e apodrecemos — lentamente y todos os dias — feito fruta qualquer num asfalto sem sombra.

o cheiro de algo que já perdeu o cheiro.

ou que está a perder. ou que está a ser roubado.

direi que atravessa-me uma angústia humana chorosa de não poder regressar aos livros.

se as minhas ambições fossem outras — materiais, puramente as materiais, e não as da alma —, pode ser que fosse fácil aceitar.

mas quis fazer algum tipo de arte neste país — neste país onde a arte é morta, sufocada, pouco valorizada, panelinha, elitizada ou desviada;

ou nem acontece, por sensações que se confundem — ou se misturam? — ao tédio, à preguiça, ao desânimo e à apatia social justificada.

c'est la vie, ma chérie. c'est la vie. [ la vie brésilienne ]