Carta confissão
Hoje, o calendário assinala cinco amargos anos, desde o fim do nosso caso de amor.
Na visão e avaliação daqueles acontecimentos, reporto-me aos planos, projetos e
sonhos de amor eterno, os quais creio ter sido eles, construídos sobre a areia das
ilusões. Mal sedimentados, o vento os repatriou para o oceano das verdades.
Marcou-nos então, essa passagem carregada de frustração e desencanto. Esforços homericos, tenho eu despendido durante esse tempo, na vã tentativa de te esquecer e
acalmar meu peito.
Quando no barco da paixão, o timoneiro é a dúvida, logo, a segurança dá sinais de
fragilidade e, rompe-se ante a fúria das tempestades humanas, tornando iminente o
naufrágio, para desespero do amor, comandante supremo da vida à dois.
Me sinto arrependido e reconheço ter violado princípios da regra de bem proceder,
relativamente aos compromissos e às relações cordiais, fraternas, as quais, um dia juramentamos. Assim agi como recurso de defesa contra o teu cruel e desvairado ciúme que nos destruía lentamente. Eu, então, já não era Eu, mas passivo
instrumento do teu sadismo e ao mesmo tempo vítima da nefanda guerra
desencadeada por ele, o ciúme, teu parceiro fiel.
Vulgarizei procedimentos e posturas, é verdade, até nos espaços públicos.
Na última noite, era alta madrugada quando retornei insolente e admito ter violado
os mais elementares códigos de dignidade e respeito humanos, ao afrontar-te
como justificativa do atraso, dizendo: -"Não deu, fui vítima do engarrafamento do beijo. Perdõe-me! Foi um procedimento meramente técnico. Você me olhava
em silêncio e em silêncio chorava pressentindo o pior. Fomos pra cama.
Em silêncio fúnebre, cada um dormiu a sua noite, ambos imersos no caos do fim.
Agora, tanto tempo transcorrido, não sei onde andas, como estás, o que fazes.
Só sei que ainda te amo tanto... tanto...