Recado de Geladeira

Eis que havia então deixado recado em imenso mural de cortiça, do tamanho de um "outdoor" algumas palavras acerca de respeito, confiança e limpeza.
Ei-lo que a resposta mais tarde viria em forma secreta, alheia aos olhos do mundo, ao saber público, não era mais no "outdoor", nem sequer no mural de cortiça, aquele mural repleto de frases festivas, acalento e carícias.
Resposta escondida... Mas por que?
Mal sabem o quanto é perigoso o abrir de correspondências de desconhecidos, ou de meros transeuntes de uma rua, num bairro nobre no qual poetas de alma - e não de glória - residem.
Comentários fantasmas semelhantes a bilhetes que nos colocam por debaixo do portão anônimos, como a vil coragem que lhes fora presenteado em seu caráter e integridade, e ainda pior, em sua educação aparentemente fina e repleta de sabedoria inútil - sim, inútil porque não adianta o saber sem trabalhar e demonstrar esse saber -.
Já vira tanta e tantas coisas em sua vida até então, balzaquiana usufruindo das lições que aprendera e almejava ainda por aprender mais e mais, jamais imaginara cenas como as que vivenciara ali, naquele bairro de poetas.
Poetas nobres de almas e corações, outros talvez nem tão felizes - resultado de decepções e desilusões -, uns que brindavam da vida em alegria trazendo para os leitores a beleza da poesia sucinta e viva com aromas e cores da natureza.
Ah, sublime natureza!
Ela que nos ensina na vida de uma árvore que parte de uma semente e muitas vezes atinge os céus com seus galhos e folhas, com a seiva que a acompanha da raíz até a folhinha que mora lá no alto quase de encontro com as nuvens.
Sabedoria de décadas, fortalecidas a olhos vistos em seu tronco, na largura que chega a ser maior que um abraço de urso.
Abraço que lembra aperto, aconchego, carinho, calor... Tudo em um animal que pode matar.
Uma palavra mal usada, proferida atentando a dor, a destruição, é um exemplo de crime, também mata.
E diria mais, mata da maneira mais dolorosa possível, porque a lemos - ou a escutamos - de pessoas que possuem o dom da eloqüência, da retórica, do discurso, da poesia e prosa.
Esse dom tão divino e rico sendo usado para a morte, a morte da amizade, da união, da compaixão.
Dom esse utilizado para a vingança, fofoca, intrigas... Imperfeição.
Que mundo de cão é esse afinal?
Em que nos tornamos nesse mundo animal?
Nos mordemos uns aos outros - pelas costas, o que é ainda pior!!! -, montamos tocaias, viramos leões de chácara, vigiamos o que um poeta ou outro escreve?
Por quantas vezes procuramos o real sentido das palavras ali escritas?
O carinho, o amor, a fraternidade, O RESPEITO...
Hipocrisia, heresia...
No final o recado de geladeira se vê necessitado de espaço até maior para que possa ser berrado e vomitado para quem tanto se preocupa com a vida dos outros e esquece da própria.
Isso tudo para dizer, que essa que vos escreve, não aprecia a injúria, a mentira, a lamúria em vão, a fuga, o acobertar, as palavras que se escondem em fuxicos, indiretas e emails...
Emails para fofoca ou intriga, não abro.
Gosto de tudo límpido e perfumado, como um riacho e uma linda flor.
E nesse bairro, ou cidade, ou Recanto, no qual residem poetas de alma, coração e mente sã, vez ou outra, como nas fábulas, infiltram-se vilões, ficam dias, meses e anos escondidos quietos, como lobos famintos prontos para o ataque.
Não permitam que lhes tire a única coisa que lhes é tão ímpar, O CARÁTER, a beleza do amor à vida...
Não deixem ser seduzidos por qualquer ser humano que se apresente em pé, forte e austeramente ditando regras e leis como ditadores ou legionários romanos.
Somos poetas.
Poetas seguidores de influências passadas, impulsionados pelo amor a nossa pátria, alma gêmea ou de ocasião, mas acima de tudo, temos personalidade.
Esse recado de geladeira não quer elogios, nem críticas...
Apenas paz...
Paz e luz...