Nicolai e a dor de cabeça

Começo dos anos 50...

Recém chegado de Israel, o romeno Nicolai, figura ímpar, expansiva e com pouquissímo "simancol", fazia história naquela cidadezinha de Minas Gerais.

Pai de Isaac, com quem mantive uma grande amizade durante a infância, adolescência e mesmo depois de adulto. Mas, quis o destino que estivéssemos, geograficamente distantes, a partir de uma certa idade.

Embora não diga, sei perfeitamente, que para ele não é muito agradável ouvir as histórias sobre seu pai, por isso mudei os nomes das personagens, inclusive o dele.

Não é por acaso que somos amigos até hoje, pois, onde impera o respeito, floresce a amizade...

Nicolai trabalhava como cobrador e vendedor, numa firma familiar, como quase todas naquela época, principalmente no interior.

Aprendera o português, mas, era evidente a grande dificuldade que ele sentia perante a língua, não sendo -por isso mesmo- levado muito à sério pelos seus colegas de trabalho, que costumavam fazer as mais diversas brincadeiras, por conta dessa sua dificuldade.

Nicolai, a bem da verdade, era um tanto quanto inconveniente e atabalhoado. Um tipo que poderíamos considerar como abrutalhado; desprovido daquilo que hoje chamamos de "finesse". Não conseguia perceber a delicadeza de determinadas situações, metendo os pés pelas mãos, causando com isso, desconforto para os demais, e atraindo, por vezes, uma certa antipatia.

Esses pequenos detalhes contribuíam para que as pessoas tivessem o ímpeto de humilhar o pobre do romeno

Dentre as muitas brincadeiras que fizeram com Nicolai, uma ficou gravada em minha memória, primeiro, por eu estar presente, e, além disso, pela cena quase surreal que nós presenciamos naquele dia.

Ele acabara de chegar de uma cidade vizinha, onde fora fazer uma cobrança, que, pelo jeito, o tinha deixado muito nervoso; com um baita mau humor e uma bruta dor de cabeça.

Ao chegar perguntou para um companheiro de trabalho -chamado Sebastião da Luz- se ele conhecia alguma coisa que desse fim àquela dor.

Tião Luz -como era conhecido- doido para sacanear o colega, disse que sabia de um remédio e que, por coincidência, trazia consigo para possíveis emergências.

Entregando-lhe dois comprimidos, disse: - Pegue um copo d'água, engula-os, e, em seguida, tome outro copo d'água.

Nicolai bem que desconfiou que os tais comprimidos fossem grandes demais, mas, como não se aguentava de dor, ele obedeceu...

Mal havia engolido o remédio do Tião, começou a sentir alguma coisa muito esquisita, como se houvesse uma fábrica de gases em seu estômago, que chegavam em sua boca e em seu nariz, em forma de borbulhas, levando o seu fôlego embora, e, as pessoas, às lágrimas de tanto rir, enquanto ele, apavorado e ao mesmo tempo puto da vida, não sabia o que fazer.

Nicolai estava, literalmente, fervendo por dentro, ou, melhor dizendo, efervescendo...

O sacana do Tião havia lhe dado dois comprimidos de Alka Seltzer; fazendo absoluta questão de lhe ensinar, com minúcias, o modo errado de tomá-los...

Aimberê Engel Macedo
Enviado por Aimberê Engel Macedo em 02/10/2008
Reeditado em 02/10/2008
Código do texto: T1207432
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