Um Causo de Terror

O seu Adelino, mais comumente chamado “Sô Delino”, lá do reino da Estrela do Sul, Triângulo Mineiro, hoje no alto dos seus 84 anos, tendo vivido também em cada canto de Goiás, um dia me contou esse cômico caso de terror e, pasmem, é verídico. Aconteceu com um primo do primo do meu primo terceiro ou qualquer coisa parecida.

Imagine só: Triângulo mineiro, terra de dona Beija, coisa de 1970, por aí, aquelas intermináveis estradas de terra que ligavam coisa alguma a lugar nenhum, cidadelas quase sem nome, terreno de ninguém. Condução? Nem carro de boi. Os lavradores daquelas fazendas ficavam horas na “linha” esperando que passasse um caminhãozinho de boa carroceria, onde coubessem todos que precisavam ir no “cumerço” resolver as coisas, de três em três meses.

E dentre essas pessoas, o seu Gumercindo, homem “sem seca”, despojado de medo ou cisma, cabra corajoso lá das terras de Borba Gato. Lá estava ele, em meio àquelas paragens, à espera de alguma condução que o levasse até o alfaiate, com destino à confecção da roupa de casamento da filha do fazendeiro patrão.

Depois de horas por ali, eis que surge a sua salvação. Um caminhãozinho três quartos de uma boa carroceria, aquele de focinho azul turquesa, boléia carregada de gente. Coisas da época. Ao pedir a carona, o seu Manoel, orgulhoso proprietário daquela máquina maravilhosa, permitiu que o transeunte subisse na carroceria, porém alertou-o de que a carga que levava se tratava de um caixão, que seria usado no enterro de um certo alguém finado naquele dia.

Gumercindo, destemido, concordou em viajar junto àquela mercadoria, sem problemas. Subiu feliz da vida e lá foi em busca do seu destino.

Ocorre que ali pela tardinha, mês de março nas Gerais, caiu o “aguão”, para disseminar aquele calor estalado de fim de verão. O viajante da garupa, despreocupado que era, sem querer se molhar, imediatamente entrou no caixão para se proteger da chuva impiedosa e acabou pegando no sono.

Pelo caminho, outros caronas desesperados, principalmente com a chuva, ganharam também aquela carroceria para a viagem. Alfim, havia mais de vinte pessoas viajando ali, encharcadas pela chuva forte.

Aqueles mineiros, que não eram tão corajosos, olhavam para o tal invólucro fúnebre com certo receio, as histórias de zumbis e assombrações, tudo lhes sobrevinha. Mas tinham que seguir e preferiam ignorar aquilo.

De repente Gumercindo acorda embriagado pelo sono vespertino e abre a tampa do caixão, espreguiçando-se com vontade. Imagine a reação.

Foi peão pulando da carroceria, foi beata orando ao senhor, foi histeria e grito pra todo lado, foi “nome do pai fii ispito santamém” sem parar, o caminhoneiro estacionou, gente caída na estrada, ninguém ficou sem pular! Alma penada! Esconjuro! Até exorcismo teve.

Gumercindo não entendeu nada. Nem o caminhoneiro.

Esse “Sô Delino” e suas histórias de terror! De arrepiar! Mas arrepiar de rir!

Nalva
Enviado por Nalva em 29/05/2006
Reeditado em 10/04/2014
Código do texto: T165537
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