A MORTE para SALVAR O "CARTAZ"

No tempo em que se tinha a palavra empenhada como valor, um fio de cabelo do bigode fazia as vezes de um “cheque ouro” bem fornido e recheado.

Havia um “EMPÓRIO” que era um misto de bodega + mercadinho+padaria+quitanda, foi assim que O Velho Severino Padilha, homem sério, turrão e de poucas palavras, mantinha o seu “CARTAZ” na comunidade como “HOMEM DE PALAVRA e PÃO DURO” e que tinha sua residência no mesmo local, pois a construção era gigantesca, e nos fundos ficava a padaria, era um quarteirão.

Pelos idos de 1968, o Velho Severino Padilha, já tinha idade avançada, pois era nascido no século anterior, pelos anos de mil oitocentos e...” desconhecemos os finalmentes”, porém sua fama, a cada dia mais, ganhava as cercanias das cidades vizinhas de Buíque-PE, extrapolando até as fronteiras do Estado.

Se você chegasse no “EMPÓRIO de Severino Padilha” para comprar pão, ele já perguntava se ia levar a manteiga, pois só vendia os dois juntos, e, coitado daquele que comprasse a manteiga no concorrente do outro lado da Praça Central, por nome da “Bodega de Pedro Pirú” seu rival ferrenho de comercio, nos longos, ...longos anos de convivência;

O Empório ficava na esquina da Praça, era uma construção centenária, sendo sua frente principal virada para a praça, tendo ao lado a Escola Municipal Duque de Caxias, que também era um prédio centenário, como tantos outros da cidade, que foram demolidos aos poucos, por arte da ineficiência cultural dos proprietários e administradores de então.

Então, certo dia chegou no empório, um tipo estranho aos citadinos ali contumaz da freguesia, era um homem com estatura pequena, meia idade, sarará, cabelos encaracolados, roupas surradas da lida ou caminhadas exaustivas pelas rodagens de piçarra da região, uma vez que era caminhante.

O Velho Severino Padilha se fazendo de bom comerciante, foi logo dizendo, “TARDES MOÇO, EM QUE POSSO SERVIR VOSSA SENHORIA”. Nisso o cheiro da “BOLACHA DE ARARUTA” tipo de biscoitão feito com mel de rapadura e fécula Araruta (Maranta arundinacea), considerada como um alimento de fácil digestão, é usada no preparo de mingaus, bolos, biscoitos e até papel.

E, quando o Velho Severino Padilha, passava a manteiga de gado em cima destes biscoitos quentes, era de enlouquecer os meninos que saiam da escola ao lado, com as notas de Cem Cruzeiro, com aqueles carimbos do Banco Central do Brasil, dizendo “VALE DEZ CENTAVOS”, mas valia alguma coisa.

O Sarará, ficou lambendo os “beiços” queimados pelo sol, e foi logo dizendo.”... MEU SINHÔ, EU TÔ DE PASSAGEM COM DESTINO A ÁGUAS BELAS, ...O SINHÔ PODE MIM DÁ ALGUMA COISA PARA EU COMER...”

Todos sabiam na cidade que o Velho Severino Padilha, jamais, na sua existência de comerciante e morador daquela cidade (desde o nascimento) deu uma esmola a ninguém, pois, não que fosse avarento, era da sua natureza mesmo.

O velho tossiu, pigarreou e disse, “... VÁ LÁ NA BODEGA DO PEDRO PIRÚ... E PEÇA UM MERCADO DE MANTEIGA de GADO, ... SE ELE LHE DER, ... VOCÊ COME O BISCOITO DE ARARUTA QUE AGUENTAR...”.

Como o Sarará não sabia da rivalidade entre os dois, ficou alegre e partiu para o outro lado da praça, para onde o Velho Severino apontou.

Ao chegar na Bodega de Pedro Pirú, foi logo dizendo, “...MOÇO, TO VINDO DE PASSAGE POR ESSA CIDADE, PEDINDO UMA AJUDA DE COMIDA, POIS VOU PARA ÁGUAS BELAS, TÔ COM FOME... PEDI COMIDA LA NAQUELA BODEGA ALI... e apontou de volta para o Emporio de Severino Padilha,.. E O DONO DISSE QUE EU VIESSE PEDIR UM MERCADO DE MANTEIGA DE GADO AQUI,... SE O SINHÔ ME DÉ... ELE DISSE QUE EU PODIA COMÊ O BISCOITO QUE EU AGUENTASSE...”

Pedro Pirú, deu uma gargalhada, daquelas que até o Santo Padroeiro “São Felix de Cantalice” botou as mãos nos ouvidos, pois Pedro Pirú há mais de cinquenta anos esperava por essa desfeita, para pegar Severino Padilha “ NA PALAVRA”.

Foi em cima do balcão, pegou a lata de cinco quilos de “MANTEIGA DE GADO”, tava quase meia botou na cabeça do Sarará, e disse “... MEU AMIGO, SÓ VOCÊ VAI ME FAZER FELIZ...” “... VÁ COMER O BISCOITO... AGORA ... COMA MESMO....COMA O QUE PUDER...” e pensou: “... EU QUERO VER SE SEVERINO PADILHA VAI AGUENTAR O PREJUÍZO”.

O Sarará, era franzino, pegou a lata de manteiga e partiu de volta para o empório Do Velho Severino Padilha, ao chegar, o padeiro estava arrumando os biscoitãos de Araruta em cima do balcão, e nesse meio termo já estava cheio da molecada esperando que o velho Severino Padilha começasse a pincelar a manteiga nos biscoitos quentes, e assim vende-los.

Quando o Velho Severino Padilha viu o Sarará, disse em tom de deboche, “... CONSEGUIU A MANTEIGA, SEU MOÇO?...” de pronto o Sarará respondeu “...CONSEGUI SIN SINHÔ... ÓIA AQUI...mostrando a lata meia do produto...”.

O Velho Severino Padilha, começou a mudar de cor, passando do branco das bochechas rosadas, para o vermelho carmim “arroxicado”, passando para azulado, para o “rôxo defunto”... e desfaleceu.

Os moleques que estavam esperando as “pinceladas de manteiga ” nos biscoitos, não mediram distância para correrem aos gritos, pela praça dizendo “... O VÉIO SEVERINO PADILHA TEVE UM TROÇO... E MORREU..”

O Sarará não sabia se corria, se voltava para a Bodega de Pedro Pirú, se acudia o Velho Severino Padilha ou se pegava os biscoito para matar a fome, pois promessa é promessa.

Foi aí que teve uma idéia repentina e gritou “... MEU SINHÔ... MEU SINHÔ...SE ALEVANTE PELO AMOR DE MEU JESUS, NUM PRECISA MORRER NÃO... POIS MINHA FOME DE TANTO APERREIO JÁ PASSOU... SE ALEVANTE ...”.

Nisso, por causa da algazarra feita pelos meninos o EMPÓRIO já tava cheio de gente, cada um que tirasse as dúvidas do acontecido sem ao menos saber do que tinha se passado.

O Velho Severino Padilha, já havia passado dessa para melhor, morreu de infarto do miocárdio, mas cumpriu sua palavra...mantendo sua fama e NÃO FEZ OS GOSTOS de PEDRO PIRÚ.

Risonaldo Costa

Risonaldo Costa
Enviado por Risonaldo Costa em 27/06/2009
Código do texto: T1669503