Não desfazendo do outro, mas sou mais o primo Luiz

Eu aproveitei um tempinho que me sobrou e fui visitar o canto do São Beto, aqui no Recanto. Lá eu li um causo muito do interessante, de um tal de Valdomiro Pelo mundo e fiquei encantado. Terminada a leitura fui dar conta da minha rotina, lavar roupa, limpar casa, fazer comida e, entre todas essas coisas, tagarelar com minha mãe. E foi quando me lembrei que na família tem um tipinho assim, meio parecido com o Valdomiro. É, acertou quem achou que é mais um primo meu. É o Luiz, sujeito antenado com o mundo. Até hoje não vi assunto abordado com ele por perto em que não metesse o bedelho, com propriedade, diga-se. Luiz é vaidoso, sempre arrumado, só é menos vistoso do que a sua timidez apenas desinibida por um assunto interessante. Embora não tenha estudado muito primo Luiz é muito, muito inteligente e, tem um dom raro, raríssimo. Na minha santa ignorância só conheço duas pessoas no mundo com esse dom. Luiz e Jesus, – não o namorado da Madonna, mas o próprio - o dom de ficar invisível. Primo Luiz na sua modéstia admite que tem o dom mas que não o usa quando quer, o dom é que se manifesta independente da sua vontade. Dizem até, que o Luiz, sempre que desaparece, forma-se um rodamoinho perto. E ele nem tem gorro vermelho, nem lhe falta uma perna e nem é negro. Um saci albino? Um ovelha negra dos sacis? – não resisti ao trocadilho-.O fato é que o primo Luiz fica invisível . E, ainda partindo das más línguas vem a história de um sujeito que esperava pelo Luiz no portão de sua casa, único lugar possível de se chegar à residência. Um dos irmãos do Luiz chegava e viu o sujeito, cumprimentou e perguntou o que ele desejava:

- Boa tarde, posso ajudar?

- estou esperando o Luiz

- Estou chegando agora e não sei se ele está. Espere que vou ver.

E o irmão do primo Luiz entrou na casa, cumprimentou e beijou sua mãe, as irmãs e, finalmente perguntou se o Luiz estava em casa. Não, disse tia Vita, mas ele não deve demorar pois foi apenas comprar pão e cigarros. O sujeito no portão foi informado e disse que ficaria esperando, sem problema. A conversa dentro de casa estava acontecendo animada, em volta da mesa, como toda boa conversa que se preze nas família Ferreira. Alguns minutos depois aparece o primo Luiz, saco de pães em uma das mãos e o inevitável cigarro na outra. Perguntado se viu e falou com o homem que o esperava no portão, disse que sim, mas que iria tomar um banho, se arrumar e que ao sair conversaria com o sujeito. Esqueci de dizer que o primo Luiz tem outra capacidade especial, embora não tão incomum como ficar invisível; o dom do silêncio, da quietude, de se mexer sem fazer ruído. E foi por isso que ninguém percebeu em que momento o primo Luiz desmaterializou-se. Foi minha prima mais nova que se deu conta da presença da ausência e saiu para ver se o sujeito que esperava no portão ainda estava lá. Estava. Ela foi até ele e perguntou:

- E então, falou com o Luiz?

- Como, se ele não chegou ainda?

- Como não chegou? Já chegou e já saiu, sim senhor. Você não viu?

- Só se ele chegou e saiu no instante em que me distraí olhando um rodamoinho que passou por aqui agorinha.