Paixão

Estou apaixonado.

Fernanda, Fer, Nanda, Nandinha, Fernandinha.

Ela é linda, maravilhosa. É uma pessoa especial. Iluminada por deus. As vezes até acredito que ele exista por causa dela.

Ela é perfeita. Quando passa na rua chama a atenção de todos. Até mulheres olham para ela, como se não acreditassem ser possível tamanha beleza.

Os homens! Estes coitados, sofredores, babavam mais que quiabo, quando ela estava por perto.

Ela é perfeita. Estou realmente apaixonado por ela. Uma paixão linda, platônica.

Ela é certinha. Culta, está estudando pelo telecurso. É muito inteligente. Consegue acompanhar todas as telenovelas e não confunde o nome de ninguém.

Bem informada, todo dia gasta cinquenta centavos comprando seu jornalzinho.

Sou muito feliz em poder estar apaixonado por ela.

- Ela sabe do tamanho de sua paixão? Indagou-me um meu colega.

- Não sei. Nunca falei com ela. Apenas a vejo de manhã, bem cedinho, quando ela vai para o cais do porto. Ela é estivadora.

Ser supervisor lá, deve ser muito complicado. A presença dela deve tocar o maior rebuliço por lá.

Ela é certinha e perfeitinha...

Tem uma cabeça que parece uma laranjinha lima. Pequenininha, redondinha e com a pele lisinha e brilhosa. Alguns despeitados acham que é oleosidade em excesso, mas é puro brilho natural mesmo.

Dois braços que parecem dois bambus, verdinhos, soltos ao vento.

Duas pernas, que parecem lindas como dois mamões papaia. Curtinhos, grossos de um lado, finos do outro, e que escondem um sabor especial. Uma manchinha aqui, outra acolá, mas é sinal que estão maduros, no ponto.

Os cabelos, parecem crina de uma jumenta manca, galopando. Movimentam-se de um lado para outro ao som de seus passos.

Os olhos! Há os olhos... Ela tem dois, são muito lindos. O tom azulado do olho esquerdo combina maravilhosamente com aquela névoa que cobre o olho direito. Alem de tudo, são tão belos, que um olho não consegue parar de procurar o outro. Fecham-se na frente do rosto, como se desejassem eternamente se observarem.

Ela é muito exigente, e no que tange a médicos, ela só aceita o melhor.

Já faz mais de três anos que ela aguarda uma vez, numa clinica muito famosa, uma tal de INSS, ou algo parecido, somente porque ela espera um certo estagiário poder atende-la. Ele deve ser muito bom mesmo.

Já tive outras paixões, mas foram perdidas em jogo.

Uma delas, a Flávia, vivia sempre ocupada. Parece que ela era atriz de televisão, porque ela nunca estava disponível para mim. Ela fazia muitos programas. O problema era ela não ser humilde. Na única vez que quase saí com ela, queria que eu pagasse cem reais a cada duas horas. Ela se justificou que para estar comigo, estaria abrindo mão de outros programas. Ela deve ser muito importante. Como não tinha o dinheiro, sugeri que ela retornasse para a televisão.

Ela se espantou com meu desprendimento, e caiu na gargalhada. Eu firmemente reafirmei: Volte aos seus programas de televisão.

Ela fez uma cara de espanto de novo, desta vez pior que a anterior. Talvez como se não acreditasse que eu soubesse que ela fazia muitos programas, de televisão.

Eu tenho um chefe que já saiu com ela várias vezes para estes programas que ela fazia. Ele sabia que eu era parado na dela. Ele sempre comentava: Ela é muito boa nos programas. Ela era com certeza uma das melhores, sem preconceitos, ou tabus, ela aceitava quaisquer papéis. De aeromoça, de enfermeira, de empregadinha doméstica, de estudante, até de prostituta ou bissexual. No fundo tenho orgulho dela até hoje. Quem sabe um dia não vou vê-la no cinema.

Mas a Nandinha era diferente, ela tinha um corpo substancioso. Musculosa, andava como se marchasse em uma parada de sete de setembro. Quase sempre de macacão sujo e despojado. Era o estilo preferido dela. Seu corpo se escondia dentro daquele macacão.

Um dia, um único dia, eu a vi de mini blusa. Jamais esquecerei aquele umbiguinho. Único, lindo. Está bem, eu vi de longe, mas dava para notar direitinho. Quase coberto pelo musculoso abdômen, e aquela certa gordurinha que caia suavemente sobre ele.

Não, com certeza não era um umbigo normal. Ao invés de ser para dentro, como de todas as quatro raparigas que conheço e com quem já saí, o dela saltava, como que desejando se mostrar para o mundo.

Deveria ter pelo menos uns três centímetros para fora do corpo. O suficiente para se sobrepor aos músculos, e para segurar aquela suave gordurinha que tentava escondê-lo.

Linda mulher era ela.

Quantas foram as vezes que me imaginei desfilando com ela no piscinão de ramos. Depois poderíamos comer aquela polenta com quiabo em algum restaurante fino.

Realmente sou muito feliz. Ela só não sabe escolher suas amizades. Ela anda muito com umas amigas esquisitonas, parecem até homens, mas deixa para lá, amizade é assim mesmo.

Esportes, pelo que sei ela fazia muitos. Faz luta greco-romana e até já fez sumô. Fico louco imaginando aquele corpitcho fazendo sumô.

Acho até que já posso morrer, pois o que sinto por ela é tão forte e especial que somente a trocaria, pela bicicleta do Pedrão. Ela está meia churriadinha, mas com alguns trocados, dá para recuperar.

Arlindo Tavares

Arlindo Tavares
Enviado por Arlindo Tavares em 10/06/2010
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