CUMPADRE VIRA LATA
“Às vezes, quando vejo um político colocando um pacote de notas na sacola, penso que talvez a culpa não seja só deles e sim de nossa raça”
Tarde cumpade.
Tarde.
Cadê a chuva?
Diz que lá na SP tá chuveno.
Puis é, meu falecido pai tinha mania de dizer que quando chovia na Sampa, no outro dia a chuva chegava por aqui.
Belos tempos, né cumpade?
Puis é, agora chove na SP e poucas chuvas chegam por aqui. Inté parece que tem uma força maior empurrando a chuva para baixo!
Puis é...
Qualé as nuvidade?
Uai, onte apareceu um empregado do governo querendo fazê as fichas dos meus cachorro.
E aí cumpade?
Uai, inté parecia que meus vira era gente. O homem preguntou a idade, se comia ração, quantas vêiz foi vacinado e mais um punhado de bobagem.
Cê respondeu tudo certinho cumpade?
No começo sim, mas no fim virou um fuzuê.
Por causo de quê?
Foi na hora que home preguntou a raça dos meus vira.
Que que cê falou cumpade?
Respondi que era vira lata.
Mas e daí?
Uai, o homem ficou bravo falando que vira lata não era raça. Que tinha que ser qualquer coisa menos vira lata.
Falava ques pudia ser cachorro português e o home não aceitava; falava ques pudia ser cachorro americano; o home num concordava, alemão, holandês, indígena, francês, africano, japonês e nada.
Cumé que acabô a história?
Uai, quando o home falô que num pudia resgistrá meus vira por causo da falta de raça, eu preguntei prele se era brasileiro.
E aí?
Respondeu que era. Priguntei se sabia votá?
E?
Respondeu que não tinha candidato que prestasse...
E?
Preguntei se tinha identidade. Quando falô que tinha só disse: Antão! Meus cachorro tamém pode!
Boa cumpade!
JOSÉ EDUARDO ANTUNES