Plantão Noturno

Plantão Noturno

Humberto fumava desde os doze anos. Durante todos os acontecimentos tristes e alegres de sua vida o seu companheiro inseparável sem pré foi o cigarro. Não desgrudava dele para nada.

A Gertrudes o conhecera aos dezoito anos e ela já reclamava do vício horrível que o deixava com um cheiro insuportável. Ele mascava chiclete, chupava bala de hortelã, e continuava a fumar. Casou, nasceram-lhe as cinco filhas. Casou as filhas, tornou-se avô e continuava com o cigarro sempre aceso entre os dedos. Aos setenta e poucos anos, passara por altos e baixo na vida solidificara sua posição na família de patriarca, conquistara um império financeiro, mas não aceitava a idéia de abandonar o cigarro.

Gertrudes ensinara o Kardec ismo para as filhas desde a infância, Humberto não dava opinião, pois jamais teve tempo para perder com religião. A família era grande, as meninas queriam tudo, aulas de piano, balé, inglês e muitos vestidos, sapatos, etc. Humberto não acreditava em nada que não girasse em torno de dinheiro. A esposa reclamava do cigarro dentro de casa, pois tinha tornado-se fumante passiva, mas ele não ligava e fumava, fumava, fumaça.

Certa vez, começou com uma tosse pequena, sem secreção, que persistiu por dois meses. Gertrudes e Vânia a filha caçula o obrigaram a ir ao médico. Ele dizia que não sentia nada e não ia largar o vício. A saúde de Humberto estava muito comprometida, ele tinha um câncer pulmonar em estado terminal. O tempo de vida que lhe restava, ele não queria saber, continuaria vivendo da mesma forma que sempre fez. Assim ele pensava que seria. Logo após o diagnóstico definitivo da doença, ele teve uma complicação e foi para o CTI. Ficou em coma por três meses, voltaria ou não?

Vânia freqüentava assiduamente o centro espírita e recebia sempre notícias dos irmãos espirituais sobre a passagem de Humberto para outro plano, mas o tempo dele na terapia intensiva era uma forma de prepará-lo para a outra dimensão. Humberto estava seco, a pele acinzentada, parecia um morto vivo. Vânia não agüentava mais a situação que toda a família enfrentava. Os médicos já haviam avisado que ele sobrevivia apenas por causa dos aparelhos.

Aconteceu então numa noite fria de julho. Nenhuma pessoa da família estava no hospital, à enfermeira que ficava na entrada do CTI e o segurança, foram indagados por dois médicos desconhecidos, eles queriam saber qual era a cama de Humberto. Ela os levou até acreditando que eram médicos novos naquele hospital. Na manhã seguinte, o telefone tocou cedo na casa de Gertrudes e de Vânia. Elas foram correndo para o hospital e ainda tiveram tempo de falar com a enfermeira que aflita relatava a estranha visita dos médicos durante a madrugada, e o mistério que cercava a morte de Humberto. Os aparelhos que o mantinham vivo ainda estavam, ligados, mas o tubo de oxigênio tinha sido retirado das narinas. Ela estava simplesmente apavorada. Gertrudes e Vânia olharam-se com profunda compreensão do que acontecera.

Vânia mostrou uma foto antiga, de um senhor com uma barba bem grande, e os cabelos penteados para trás, perguntou para a enfermeira se o reconhecia. Ela afirmou com a cabeça que sim. Vânia colocou calmamente a mão sobre a mão trêmula da enfermeira e esclareceu:

- Este senhor já faleceu há muitos anos. Ele é um irmão espiritual que ontem veio visitar meu pai e ajudá-lo na sua passagem para outra dimensão. Não fique preocupada, pois esperávamos uma coisa desse tipo, já que meu pai era um homem muito apegado ao plano terrestre. A enfermeira ainda conversou mais alguns minutos com as duas e disse-lhes: - Se eu não tivesse visto, não poderia dizer, mas os espíritos estavam aqui ontem à noite no Platão noturno.

Aradia Rhianon
Enviado por Aradia Rhianon em 15/02/2012
Código do texto: T3501409
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