Grande Trianon

Minha Nona era uma mulher muito falante, contava histórias que guardo na memória, e que recorco com saudades, não bem das histórias, mas sim dela, do seu jeito risonho e ao mesmo tempo severo de tratar as pessoas e as coisas. Mas não é bem isso que pretendo contar aqui. Ela sempre me falou de um lugar, onde as pessoas iam depositar na beira de um riacho, chamado de Poçinho, alimentos e vestimentas, cobertas e remédios. Deixavam tudo alí na margem e não ousavam ultrapassá-la. Traziam em grandes carroções puxados com seis cavalos, e largavam tudo o que traziam e voltavam às pressas para uma lagoa a dar de beber água aos cavalos. Um hospital ainda em precárias condições começava a dar atendimento à pequena população. A lagoa tornou-ne Lagoa das Lágrimas, hoje um ponto turístico de Guarapuava, e o pequeno hospital, hoje é o Hospital de Caridade São Vicente de Paulo.

Minha curiosidade era em torno do porquê, as pessoas irem até às margens do Poçinho e não passarem dalí, e ainda deixarem alimentos, vestimentas e remédios alí.

Então, minha Nona Sophia, contava que além daquelas margens havia um campo de leprosos, e também um cemitério que eles mesmos, os doentes, haviam dado início.

Como era um lugar alto, no começo chamaram Colina do Leprosário. Ao passar dos anos, com o avanço da medicina, a hanseníase foi diminuída, e o local passou a ser um lindo campo florido, e recebeu o nome que mantém até hoje: Jardim Trianon.

Eu cresci ouvindo essa história e me condoía em pensar nas pessoas que nesse Jardim Trianon, haviam sido sepultadas. Tremia quando alguém me dizia que morava no Jardim Trianon. Dizia para mim mesma, em meu íntimo, que nunca iria morar nesse lugar.

Certa vez viemos com um senhor, Otacílio Rocha, e suas filhas, Francisca e Rosilene, trazer alguns donativos ao S.O.S, e passamos em frente de uma bela construção. Era uma Igreja da Comunidade Ucraniana. Havia em frente um quase bosque, que hoje é uma bonita praça. Não imaginava que estava no Jardim Trianon, senão sairia correndo.

A cidade cresceu, e eu também cresci, mas essa história sempre estava em minha mente, sempre. Tinha horror em pensar em morar num lugar onde havia existido um cemitério e um leprosário, não que por preconceito, mas por um sentimento muito estranho, meio místico, típico de filme norte-americano, ´com Apaches feiticeiros, índios cheios de maldades, coisas asssim.

Aos 19 anos conheçi Antonio. Namoramos e um ano antes de casarmos, ele comprou nossa: no Jardim Trianon. Quase não casei, mas hoje estou aqui, há felizes 25 anos, e daquele sentimento místico das histórias de minha Nona Sophia, só restam, mesmo, muitas saudades...

NENINHA ROCHA
Enviado por NENINHA ROCHA em 19/01/2007
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