A BEATA

A BEATA

Erotildes apaixonou-se pelo mineirinho. Ele era forte, moreno, musculoso, e simpático. Tinham a mesma idade, quarenta e um anos. Existia uma diferença social entre os dois, porém para ela, que nunca tinha ficado com um homem daquele porte, este era apenas um mínimo detalhe. De acordo com a fé e a segurança em si mesma, Erotildes, acreditava, que o tempo, transformaria um homem rude, num verdadeiro cavalheiro.

O tempo passou, um ano e dois meses, eles pularam todas as fases do conhecimento, e foram logo morar juntos. Erotildes vivia no céu, no sentido amplo da palavra. Também a esta altura, estava difícil pisar em terra firme, pois tudo girava, girava, girava, inclusive as inúmeras dívidas que ela tinha feito para “melhorar” o mineirinho. Primeiro foram as roupas, depois o dentista, pagou ainda algumas dívidas que ele tinha feito, e um mimo aqui, um presente ali, ela estava completamente falida, mas em matéria de amor, continuava nas nuves, sonhando com um romance que só existia em sua imaginação.

O mineirinho tinha um nome é claro, Samuel, e ela só o chamava pelo nome, quando estava aborrecida com ele. Esta era a centésima vez que falava naquela noite: - “ Samuel, onde estavas, que o procurei a cansar, ao sair do culto, e lá não estavas, como tínhamos combinado?” Samuel continuou assistindo ao jogo na TV e fingiu que não escutara porque o volume do aparelho estava muito alto. Cansou-se de perguntar e foi dormir aborrecida. No fundo da sua cabeça, vinham as palavras de uma colega da igreja que insistia em comentar, sobre o marido da Erotildes: - “Engraçado, sempre vejo o Samuel no quintal da casa de sua mãe”. Erotildes era realmente muito ciumenta, e seus outros relacionamentos amorosos não tinham sido tão envolventes como o que vivia com Samuel. Tirando as incontáveis brigas, a falta total de reciprocidade em todos os aspectos, a rudeza que ele a tratava, e os três boletins de ocorrência registrados, após algumas agressões que ela tinha sofrido quando discutia com Samuel, ela julgava sua união um paraíso. Não ligava nem mesmo quando suas colegas de trabalho perguntavam o que eram as manchas roxas no rosto.

Era uma religiosa convicta, atuante na obra de Deus, e estava envolvida no trabalho social de sua igreja até o último fio de seus cabelos. No inicio ele a acompanhava, depois alegava cansaço, pois sentia muitas dores na coluna, trabalhara muito no passado em serviços pesados, e agora que tinha boa vida, e o pão nosso de cada dia, não precisava mais ser sua preocupação, aproveitava para descansar um pouco, enquanto Erotides trabalhava diariamente em sua obra social.

Certa noite, após o culto que acabara mais cedo, Erotides resolveu voltar para casa a pé. Nem precisava ligar para Samuel vir buscá-la na igreja. Chegou a casa, e teve uma surpresa, sua irmã lá estava com Samuel numa prosa de fazer gosto. Eles estavam tomando uma cervejinha, e riam animados como se a presença de Erotildes, não fizesse a mínima diferença. Ela tentou disfarçar, e pela primeira vez percebeu que Samuel a desafiava com o olhar, parecia mesmo que queria briga. Ela entendeu a mensagem, e calou-se. A irmã ainda ficou por mais de uma hora, finalmente, para revolta de Erotildes, pediu que o cunhado a levasse em casa. Erotildes estava enfurecida, que nem acompanhou o marid. Os dois saíram e ela foi dormir, no dia seguinte precisava chegar cedo na escola, onde era diretora.

Alguns meses se passaram, e as visitas da irmã de Erotildes a sua casa tornaram-se mais constantes. A Cida, vinha sempre no horário do culto, e quase não encontrava com a irmã, estava sempre de saída quando Erotildes chegava, e o cunhado sempre a levava em casa. Cida era bem mais nova que Erotildes, muito diferente da irmã, não tinha emprego certo, não gostava de igreja, muito menos de ficar horas até tarde da noite enfiada em um culto ou em louvor. Apreciava mesmo era dançar, enfeitar-se para os moços bonitos, e de vez em quando, arranjava alguém com quem ficava por uns tempos.

Certa vez, a Erotildes deu uma imprensada na irmã e falou: - “Eu não estou gostando nem um pouco de vires sempre quando não estou e ficar de papo com o Samuel”. Cida, sorria fingindo-se de zangada, e dizia: - “Maninha, tu estás muito ciumenta, imagina, marido de irmã para mim é sagrado”. Erotildes foi agraciada com uma benção especial. O pastor designou-lhe um novo cargo na igreja, agora era missionária, responsável pela direção do grupo jovem. Ela ficou cheia de orgulho e dedicava-se com afinco a sua nova função. Pensava em um dia transmutar sua jovem irmã e levá-la para a obra de Deus.

Numa quarta-feira a noite após o louvor, o filho do pastor, deu uma carona para Erotildes até sua casa, pois chovia torrencialmente. Ela aceitou e chegou em casa, sem avisar Samuel. Ficou gelada ao entrar em casa e deparar com a cena inesperada em plena sala de jantar. Samuel e Cida estavam fazendo amor, em verdadeiro extâse, ela abrira a porta na hora que os dois gemiam bem alto, que a vizinhança inteira ouvia. E enquanto o mundo rodava ao pés de Erotildes, os dois procuraram vestir-se rapidamente.

Erotildes sentou-se em uma cadeira e chorou como uma criança perdida. A irmã foi embora, levada por Samuel no carro que a Erotildes suava para pagar as prestrações. Quando ele voltou, a Erotildes ainda ouvia as desculpas do marido: - “Você tem que entender, a Cida é uma moça fogosa, e depois ela não tem esse problema que você tem, a igreja, sou homem, e não gosto de ficar sozinho, você me troca todas as noites pela igreja, aí eu me divirto um pouco”. Ela não tinha argumentos contra a lógica dele. Estava tão cansada que resolveu tomar um calmante bem forte, e no dia seguinte pensaria no que fazer.

A manhã seguinte foi a pior de toda a sua vida. Não encontrou o Samuel ao seu lado como esperava, ele tinha partido. Não foi trabalhar, sentia-se deprimida, e exausta de tudo e de todos. À tardinha, a Suelen, sua única filha que morava com sua mãe, no mesmo quintal onde morava também a Cida, telefonou e disse-lhe: - “Mãe, a senhora precisa saber a novidade, a tia Cida, está grávida, sabe depois de tanto tempo, pensando que não iria engravidar, ela finalmente conseguiu. Ela está muito feliz. O namorado dela ainda não sabe, mas acho que logo, ela vai apresentar ele para nós.” Erotildes, desligou o telefone sem responder nada para a filha, não queria saber de mais nada, correu para a cama, e ficou lá por muito tempo, imaginando se aquele colchão também teria sido testemunha dos momentos de amor de Samuel e Cida, será que eles tinham feito o filho em sua cama?

Aradia Rhianon
Enviado por Aradia Rhianon em 09/03/2012
Código do texto: T3545331
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