Noite de Baile
   
    No dia daquela noite, a manhã vem chegando mais cedo, deixando um resto de sono para trás, três quartos de hora adiantados, funcionários eficientes. Recolhem seus sonhos das nuvens, sem preguiça, abrem os olhos sobre o campo, embora ainda haja uma vontade de dormir até não ter mais sono.
    Parece que os meninos mais espertos vão apagando cada estrela enquanto a manhã prossegue em direção ao horizonte.
    - Oi!
    - Oi! Bom dia!
    - É hoje? - pergunta só pelo prazer do sim.
    - Hoje mesmo.
    - É tomar leite rápido, almoçar mais cedo, pegar a lida do galpão.
    - Enrolar as roscas no barbante, trazer a branquinha e confirmar a vinda do sanfoneiro.
    - Ah, isso é certo.
    Naquele dia, na fazenda, tudo transcorria com mais alegria.
    As pessoas comentavam sobre quem ia e quem não, sobre as roupas, enquanto os rapazes segredavam sobre aquelas que dançavam melhor, ou que apreciavam o apertadinho.
    Já quase de noitinha, era hora de se armar as gambiarras. Depois, molhar o pátio, pois o tempo estava seco, mas a poeira não podia subir.
    O cenário estava pronto; havia barraquinhas com doces, outras com carne frita e refrigerante, outras com cachaça e rosca enrolada no barbante, qual tosco colar.As barraquinhas eram arrumadas ao redor, de forma que, no meio, ficasse o pátio varridinho, onde haveria a dança dos casais.
    À chegada dos sanfoneiro, todos se alegravam, as mulheres apressavam-se com suas fitas, seu batom, seu "Angel Face" e seu rouge, para depois se perfumarem.
    Até que todos chegavam ao salão e começava o baile.
    Havia aqueles casais, verdadeiros pés-de-valsa que dançavam quase a noite inteira. Havia também os molecotes já com quinze anos e daí para frente, que ficavam à espreita. Quando os senhores de terra já estivessem bastante embebedados , com o pedaço de rosca dormindo também no canto da boca, aí era a vez dos meninos e das madames fazerem sua alegria: dançavam à vontade, e era um bate-coxa, um roça-roça... Ai, que suor! Ai, que tá bão...
    Depois de muito tempo, os senhores despertavam, concluíam que já estava tarde, carregavam suas donas e iam dormir.
    Aquela noite de amor era especial: para os casais e para os meninos, que temiam amanhecer cheios de espinhas no rosto.
    A noite é mesmo uma apavorada. Tem medo das trevas. Por isso acende estrelas que permanecem brilhando até a primeira ordenha do dia após o baile.
Flávia Melo
Enviado por Flávia Melo em 13/03/2012
Reeditado em 13/03/2012
Código do texto: T3552084