O GÊNIO E RETORNO DO CORONEL(11º CAPITULO)

Ao avistar a carruagem descer a encosta pela branca e tortuosa estrada que dava acesso a fazenda, o capataz bastante apreensivo foi logo avisando aos seus subordinados, --Se preparem porque o coronel vem ai, verifiquem cocheiras, bebedouros, e as portas do celeiro, vocês o conhecem melhor que eu, em nada satisfaço o homem mesmo que esteja tudo em ordem ele sempre encontra um pretexto para descarregar seu veneno em cima de gente.

--Bom dia Vicente! – Bom dia coronel, como demorou tratamento longo não? Estimo que tenha se recuperado com sucesso! –Melhor não poderia ser-, Clóvis o manteve informado? Passei vários telegramas avisando minha situação espero que ele os tenha enviado, passei por La rapidamente, conversamos tantas coisas e me esqueci deste detalhe! –Manteve sim coronel vieram todas as mensagens, estão arquivadas na sua escrivaninha querendo poderá conferir! –Que isso Vicente não será necessário confio em você!—Desculpe-me coronel--, o senhor está bem? –Como assim, bem do que? – Esqueceu daquele impasse que tivemos na véspera de sua viagem? O senhor me dizendo o quanto eu era imprestável? Eu ainda estou aqui porque dona Manoela me pediu ser paciente e ficar pelo menos até sua volta!

– Vicente em dois meses que estive fora aprendi coisas que durante meus oitenta anos mergulhados aqui neste sertão eu não consegui aprender. Perdoa-me e me dê uma chance para que eu possa redimir os meus erros. Reúna todos os trabalhadores, vá até a sensata traga os escravos, quero uma reunião com todos dentro de meia hora!

-- Ao ajudar a patroa conduzir as malas para dentro de casa ele pergunta ---dona Manoela o que está acontecendo? O coronel só pode estar de miolo mole, o homem chegou manso como um cordeiro, estou estranhando sua maneira educada de falar, qualquer coisa está acontecendo. Deu ordem para reunirmos, todos nós, inclusive seus escravos, ele nunca permitiu a eles participar de reunião nenhuma si quer eles tem o direito de entrar aqui no pátio!—Sei não Vicente eu também estou com um pé atrás, mas faça o que ele recomendou!

Reunidos na varanda da casa grade Certoro fez questão de abraçar um por um, até seus escravos a quem ele parecia ter nojo. Ficaram todos abismados com aquela atitude, aquele velho nunca havia demonstrou qualquer gesto de carinho e gentileza para com os seus subordinados. – Dei ordem ao Vicente para reunir-mo-nos simplesmente por que preciso do perdão de todos, por minhas grosserias e o mau trato. Durante anos eu mantive os olhos vendados pela ignorância, foi preciso que uma enfermidade ocorresse para que a minha máscara caísse, e o destino colocar em meu caminho alguém capaz de tirar-me da escuridão provocado por ela, mostrando-me que não é necessário acumular riqueza para ser feliz. A partir de hoje meus escravos estão livres e serão remunerados com a mesma igualdade de todos que aqui trabalham, podem plantar e colher nestas terras construírem suas moradias caminharem livres como qualquer cidadão. O único consolo que eu tenho é de nunca ter castigado com tortura física nenhum de vocês. E tem mais qualquer um terá sua carta de alforria à hora que desejar e poderá sair e trabalhar onde bem entender! Estamos entendidos? Alguém tem algo a dizer?—Eu tenho --, volte para capital coronel, vá se tratar,o senhor não se curou, está delirando, e o quanto dizer que nunca nos torturou fisicamente, isso é verdade, mas o veneno de suas palavras suas ações, e a falta de respeito a nossa dignidade e a condição de vida que nos submeteu, deixou profundas cicatrizes em nossas almas e feriu mais do que qualquer chibata ou pelourinho! -- Chico velho me perdoa, eu sei que tu és o escravo que mais sofreu, mas Jesus também sofreu e nos últimos momentos de sua vida pediu a Deus perdão pelos pecados de seus algozes!—É verdade coronel, mas Jesus só fez o bem, nunca praticou as maldades que vosmecê praticou! Perdoar, a gente até que perdoa, seguindo o exemplo de Jesus, não que vosmecê mereça perdão!

--De fato coronel Certoro estava realmente arrependido e as coisas iriam mudar completamente para todos que com ele conviveram. Só que ninguém estava acreditando no que ouvia, por eles, o homem estava de miolo mole!

Enquanto os empregados de Certoro comemoravam, o milagre da liberdade em todas as suas propriedades. Na estância “Ninho do Colibri“ de propriedade do pintor Luiz Gonçalves. Laura e seus criados preparavam uma festa para receber o neto e seu grande benfeitor Richard, cuja chegada prevista para o fim de semana, de acordo com telegrama recebido. Através de um mensageiro, Meire sua neta e o marido foram convidados para uma confraternização, ocasião em que Luizinho teria agradáveis surpresas com os últimos acontecimentos envolvendo seus avôs paternos.

O sucesso do pintor no exterior rendeu-lhe além de muita fama uma vultosa cifra jamais vista na historia de um pintor, engordando sua conta bancaria, mas este fator não mudou em nada seu caráter e sua maneira de ser. Ele continuou com a mesma simplicidade e sua humildade característica de menino sertanejo amante da natureza.

Ao chegarem à mansão de Meire a luxuosa carruagem estava preparada, Para conduzi-los até o Ninho do Colibri. Richard e Vilma sua esposa, acompanhavam o pintor. Ansiosos para conhecer o neto foram diretos aos aposentos da filha. Meire os acompanhou e numa conversa confidencial explicou a programação agendada para aquele tarde. Foi só o tempo para o banho do casal, a carruagem tomou o rumo da propriedade de Luizinho, Meire se desculpou com ele dizendo que haviam programado uma visita a Laura por ter encontrado com uma sua conterrânea no hospital, e prometeu lavar noticias suas a ela.

Fizeram uma viagem tranquila apreciando a bela paisagem naquela tarde. Ao subir a escadaria de acesso à sacada de seu palacete, do alto, o jovem parou por um momento e contemplando o horizonte exclamou: --“Louvado seja o senhor Deus que criou toda esta obra maravilhosa que meus pobres olhos vislumbram, bendito seja este manto verde que veste a terra, cobrindo-a de flores, encantos e beleza, tu és o braço direito do mestre... Oh consagrada mãe natureza!” – Amem... Responderam todos ao mesmo tempo em coro! Ao adentrarem a sala, outro visual encantou o pintor, a mesa repleta das mais finas iguarias o aguardava. Meu senhor e meu Deus não têm palavras para descrever tantas maravilhas que me levam a crer, ser eu, realmente um privilegiado filho teu! -- Laura o abraçou longamente, -- que Deus te abençoou meu neto querido, eu tenho certeza, que tu és um privilegiado de Deus sim, ele te acompanha desde que foste concebido --, mas agora vá tomar um belo banho e se preparar porque as surpresas não param por ai, as melhores estão por vir!—Está me deixando curioso o que há de tão importante que merece comemorar?—A primeira é seu regresso as outras, prepare-se primeiro, você vai ficar super feliz!

Após tomarem lugar a mesa Luizinho fazendo uso da palavra disse: Façamos nossa a oração, eu sempre optei pelo silencio nos momentos das refeições, mas hoje neste banquete comemorativo será aberta uma exceção, para que possamos expressar nossa alegria de estarmos reunidos como uma verdadeira família. – Alegria maior meu querido neto é a revelação, que motivou este nosso encontro! E que mistério é esse vó diga logo estou ansioso demais não espero nem mais um minuto, acaso não dizer volto imediatamente para a França! – Então eu passo a palavra para sua tia avó dona Meire!—Que isso de tia avó? – Diga dona Meire à palavra é tua!

--Se a palavra é minha ouçam minha história... -- Perdi minha mãe, aos quinze anos, meu pai um comerciante de manufaturados importados seguindo a cultura machista que permeia a sociedade me arranjou um noivo dez anos mais velho que eu, casei—me com ele, e mudamos para a França. Não me queixo--, meu marido, foi um bom homem compreensivo educado e ensinou-me tudo que eu não sabia da vida, me deu conforto e uma filha a Vilma casada com Richard. Tive apenas uma irmã a deixei com meu pai aos cinco anos de idade, ele a colocou num internato, nunca mais a vi. Poucas vezes visitei meu pai, que se casou em segundas núpcias e não teve filhos, não pude ver minha irmãzinha que estudava no colégio interno. Quando ela completou seus quinze anos, meu pai concedeu sua mão ao filho de um coronel, um rico latifundiário sertanejo também seu fornecedor como foi meu marido. A essa altura meu pai trabalhava no comercio tanto importando com exportando. Vindo visitá-lo tomei conhecimento do casamento de minha irmã. Fiquei penalizada, porque eu, como ela, casei sem conhecer meu noivo, mas mudei para exterior e não perdi o contato com ele, ela ao contrário de mim mergulhou no sertão e nunca mais deu noticias. Tempos mais tarde meu marido e eu viemos ao Brasil com a intenção em procurá-la, meu pai havia falecido, minha madrasta vendeu todos os seus bens e desapareceu sem deixar rastros. Há cerca de vinte anos meu genro Richard viajando se encantou com uma pintura na parede da estação de uma pequena cidade mergulhada no sertão, descobriu que o autor da obra era um garoto de dez ou doze anos não me lembro ao certo, este garoto afirmou ser neto de um coronel e sua avó se chamava Manoela, uma história um tanto confusa. O fato é que este garoto é hoje este gênio que aqui está e sua avó minha amiga Laura, que trabalhou muitos anos na casa de Richard e Vilma eu a vi algumas vezes, mas não chegamos ser amigas como hoje somos. Pois bem vejam como é o destino, semana passada acompanhando minha neta ao hospital me depara com uma idosa mais nova do que eu dez anos. Senti uma estranha atração por ela, algo que não sei explicar, e ao admirar sua elegância sertaneja a perguntei: acaso seu nome é Manoela?—Exatamente, foi à resposta. -Então me dê logo um abraço porque vós sois minha irmã! O resto da história eu deixo com você amiga Laura!

(Continua na próxima semana)

Geraldinho do Engenho
Enviado por Geraldinho do Engenho em 11/02/2013
Reeditado em 11/02/2013
Código do texto: T4134201
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