Onde? Quando? e Por Quê?


Parece que eu nasci com um destino: o de especular a vida dos outros e me meter onde não devia.
Sentada em uma cadeirinha, na calçada da minha casa lembrando que nesta época morávamos numa cidadezinha do interior onde até hoje as pessoas têm o direito de sentar nas calçadas, e conversar com seus vizinhos! Pois bem nestes costumes estava eu ensaiando muito cedo.
A minha mãe havia me presenteado esta cadeirinha e ali era meu trono de fazer perguntas para toda pessoa que por ali passava.
Ei vem cá!
Como é seu nome?
Você vai prá onde?
Onde fica?
Vai fazer o que lá?
Você é filha de quem?
Como é o nome da sua mãe?
Como é o nome de seu pai?
Você tem irmã?
Como é o nome dela?
E olha que tinha gente que respondia a todo esse interrogatório, sem pestanejar. E o mais engraçado era a minha voz de comando, chamava e a pessoa vinha.
E não contente com tanta pergunta, na cozinha continuava:
Mamãe como é meu nome?
Mamãe quando eu nasci?
Mamãe eu nasci de noite ou de dia?
Chega! Chega! Por hoje!
Era chata! O pinguinho de gente era chata!
E tinha a péssima mania de me meter onde não devia.
A minha mãe estava preparando o enxoval do bebê que estava por vir e aquela estória de cegonha estava me deixando irritada, porque por mais que fizesse os cálculos, esses não batiam e minha imaginação era a mil por hora e por esta razão resolvi investigar esta estória direito.
Se a cegonha trazia o bebê pelo telhado da casa, de certo lá devia existir uma janela ou um buraco, senão como será que ela entraria? Pela porta com certeza não era porque se assim fosse eu seria a primeira a vê-la. 
Aproveitando um dia que a minha mãe havia saído para ir ao médico, decidi esclarecer esta estória de uma vez por todas.
Chamei o meu irmão e disse: que em cima da casa havia uma bola e um carrinho e que ele deveria subir até lá para pegar.
Eu já sabia o ponto fraco do meu irmão: ganhar presentes e como não era nem Natal e nem dia de aniversário, presente fora de época? Duvido que ele não cresça os olhos!
E assim ficou combinado, no quintal da minha casa havia uma arvore, quase que encostada na parede, era subir e já estaria em cima do telhado.
E procura, e procura e procura e nada de bola e nem de carrinho, e meu irmão subindo cada vez mais até chegar à cumeeira da casa onde por certo, na minha imaginação deveria existir com certeza um buraco.
A discussão entre meu irmão e eu era feia!
Aqui embaixo eu gritava: sobe mais menino cego, aí em cima tem um buraco, e a bola e o carrinho está dentro.
E lá de cima meu irmão berrava: sua mentirosa, aqui em cima não existe buraco nenhum e nem bola e nem nada.
Pronto. A minha dúvida estava esclarecida, a cegonha não vinha pelo telhado como diziam, esta estória estava mesmo mal contada e estavam me enganando!
Mas uma grande confusão estava por vir! Meu irmão não sabia como descer do telhado que a estas alturas devido o calor, as telhas estavam quentes e meu irmão começou a chorar e eu também não sabia o que fazer, não tinha outra saída, chamar meu pai que tinha um comércio do lado da nossa casa!
Imagine o desespero do meu pai, que veio correndo, meu irmão aos berros, os funcionários do meu pai também vieram, os vizinhos também e meu pai querendo saber o que era que aquele pirralho estava fazendo em cima da casa e meu irmão dizendo foi ela que mandou, e meu pai respondia está muito bem mandado, olhava pra mim e dizia essa você vai ter que me explicar, e as escadas eram pequenas, não alcançavam o telhado da casa e subir pela arvore nem pensar porque por se tratar de um pé de goiaba, que nem goiaba tinha ainda não suportaria o peso de um homem!
E enquanto isso meu irmão lá em cima ainda, eu embaixo me valendo de tudo quanto é santo por fim amarraram uma escada na outra e trouxeram meu irmão pro chão.
Que sufoco meu Deus! Levamos semanas com a ladainha do meu pai e da minha mãe no ouvido e meu irmão com uma cara do tamanho do mundo pra mim me chamando de mentirosa, e eu jurava que a bola e o carrinho estavam lá sim, eu vi, mas com certeza alguém mais esperto foi lá e pegou!
Passaram-se os dias e numa tarde que lembro muito bem, falei pra minha mãe: a cegonha não vem pelo telhado porque lá não existe nem janela e nem buraco!
E foi daí que ela entendeu a minha armação!
 

Emedelu
Enviado por Emedelu em 31/03/2013
Reeditado em 05/04/2013
Código do texto: T4215961
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