A sociedade entre o sertanejo e o cururu

Sociedade entre o cururu e o homem

Seu Josias depois de um dia todo no roçado olhou para o céu e sentiu os olhos encandearem com o clarão do sol, o couro do braço queimando e o estômago querendo se pregar nas costas, soltou a enxada e arrastou uma melancia do canto da terra. Saiu em busca da taperinha que tinha construído por ali para ficar ranchado enquanto trabalhava. Já foi reclamando da mulher e perguntando pelo almoço, que sertanejo não gosta de demora, sentou-se em um tamborete e enfiou os pés na água da bacia que Dona Carmelita já tinha deixado pronta. Depois, deu de garra do facão e partiu a melancia, na cumbuca que usava como prato, a mulher já trouxe umas três conchas de feijão, uma meia xícara de farinha de mandioca e ele nem quis arroz, comeu assim mesmo. No fim, benzeu-se e levantou-se para pendurar uma rede e descansar um pouco. Antes pegou do pote de barro um copo d’água, no primeiro gole a sentiu gelada, estranhou, mas achou foi bom. Ainda interrogou-se sobre a temperatura fria e um gosto peculiar, no entanto logo conformou-se pensando consigo mesmo: - Nosso Sinhô é bom com quem trabalha, deve ser por isso. Deitou-se, mas nem teve tempo de cochilar, pois ouviu Dona Carmelita chamá-lo: - Josias se levante que tem um cururu de todo tamanho dentro do pote, venha tirar. O homem já saltou da rede invocado, olhou para o pote, ainda quis derramar a água, mas depois de pensar disse :

-Ô mulher, deixe de besteira que isso é limpo, vive na água!! Ele gela e eu deixo ele viver, estamos trocando favor!! Num bula nele não!!

E assim cururu e seu Nonô iam passando, um vivo o outro aproveitando a água fria.

Uns quinze dias depois quando foi aproveitar aquele gentil regalo da natureza tomou um copo cheio da água de uma só vez, mas a sentiu quente e lhe dar um engasgo forte e desagradável... Correu então para o pote e caçou seu amigo, que para seu desanimo havia desaparecido, de pronto esbravejou: - ô criatura teimosa, dê de conta do meu gelador!! Bora logo!. Mas sua paciente Dona Carmelita foi logo se defendendo: - Deixe de levantar falso homem eu não sei de vida de cururu nenhum! Ele completa nervoso: - E pra acabar de acertar esse pigarro me agoniando, eu vou logo saber que tinha é essa!

O sertanejo foi na frente de um espelho posto junto a sala, abriu a boca, olhou lá dentro da garganta e viu uma pontinha estranha, enfiou a mão goela abaixo e puxou com força, e de dentro saltou uma jararaca, ele no susto a jogou no chão. A serpente ficou imediatamente armando o bote. Mas como seu Nonô é muito engenhoso disse contente: -Mistério resolvido! Agilmente passou a mão nas costas e tirou o facão que não se apartava dele, golpeou a cabeça da cobra sem lhe dar chance de defesa, levou o cadáver para o terreiro e a pobre esposa o seguia atrás aperreada : -Homem deixe de invenção, já matou a miserável, quer o que mais ? Seu Nonô justifica: -Eu vou bem dá cabimento a essa camarada , ela tinha de devolver meu gelador! Depois rasgou o couro da cobra e tirou o cururu de dentro que foi logo pulando e coaxando um – ‘ueber’.... Que seu Josias poliglota e experiente traduziu assim :

-Eu sabia que você vinha !

Michelle Morais e Seu Josias
Enviado por Michelle Morais em 03/05/2013
Reeditado em 26/09/2017
Código do texto: T4272890
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