Sorte de prego

Outro dia tava eu num hotel fazenda, veno tilivisão, na casa do cumpadi Gerardinho, aquele baxim que se apendura nas tetas das vacas tudo dia cedim, insina os minino a tirar leite delas e leva os hospedi tudo para modi passeá nos cavalo, nas carroça cuns fi macho dele.

Puis é! Tilivisão, quelas caxinha, qui fica apendurado nuns ferrim enriba das casa, que parece gente proseano com nóis, vendeno coisa, falano bestera, se atracano, se relano, pegano, fazeno saliença, se abulinano, contano prosa ruim, ensinano o que num se deve pros minino e passando futebór.

Antão tava eu oiando ela e vi uma muié potrancuda, uma lindeza só, dizeno prum tar de foguim, da novela, que “sorte de prego num muda, é sempre iguar”.

Uai sô!?

Num preguei cum zói nem um cadiquim ancim, pra modi intendê,.cumprendê o que quela belezura tava falano: - sorte de prego ... sorte de prego ... de prego!!!

Antão, manhazinha, fui pro barracão pra modi me assuntar com um preguim e prosear ele mais eu, pramodi descasquetá minhas cachola, desaformigá os miolo.

Prucurei... Prucurei... inté cachei unzinho sór, deitadim na caixa de ferramenta no fundo do barracão.

Tava ele lá, quetim, deitadinho numa caxinha, e eu, devagarim pra num sustá o bichim, fui puxano uma prosa pra modi começa as cunversa:

- Oi preguim! Bão?

Nada do preguim me vortar as atenção.

- Oi preguim! Bão?

Preguntei novamente e nada do bichim me arrespondê.

De repente veio aquela voz braba me dizeno:

- Bão nada, sô! Já sei que ocê vem cá, cum martelo e cum licate pra mode me pregar em argum lugá! Num é?

Me arrespondeu o tarzinho, tudo cheio de macheza, subino nas razão e nas corage.

- Num fica ansim sô! Eu vim aqui pra modi prosear um tico com ocê. Num truce nem martelo nem licate.

- Antão vira seus fundilho pra cá, pra modi eu oiá e vê se troce ou não!

O tar preguim ficou meio ansim... discunfiado ... me oiando meio de banda ... Me oiano cum discunfiança... Antão cumecei a puxá cunversa cuêle pra modi intendê o que aquela muié falô na tilivisão.

- Ê! Preguim! Tava matutano aqui cas minha cachola cumu era a vida dum prego e antão me acorajei de prosear com ocê e perguntá como é sua labuta.

O tar preguim, ainda discunfiado... Me oiando meio de banda, se arresorveu prosear mais eu. Antão fomu trocano as palavra.

- Que ocê qué sabê da minha vida? Pode me preguntá que respono! Mas temo que se ligêro, pois pode ser que pareça argúem pra modi me usar e me enfiar em arguma coisa e pronto, lá vou eu ... Levá na cabeça!

- Eu queria me assuntar do modi ocê vivê, cumu é sua vida, sua labuta, se ocê é filiz!

- Óia! (respondeu o preguim) – Sou filiz pra modi sei o que me espera e como vou me acabá. Só num sei que maneira nem quano. Mas tenho minha serventia.

- Então ocê é que nem nóis (respondi). Nóis tamem somo ansim. Sabemo o que temo que fazê, sabemo pra mode de que tamo aqui, sabemo que vamo acabá um dia, mas num sabemo como, nem quano.

- É isso memo! E continuou o tarzinho:

- Nóis sofremo muito quano chega a derradera hora. Ocês vem cum martelo de dois chifrim emriba, um licate e cumeça a bater ni nóis cum raiva, pareceno que nóis somo das mardade!

- Uns acerta nóis da primeira porretada. Otros acerta nóis de preguiça, dá uma, duas, três, quatro e aí é que nóis demoremo mais pra ficá preso nas coisa.

- Os mais assuntados, bate ni nóis de uma vez, os burrim, que num sabe fazê direito, faz é doê muito nossa cabeça.

- A dispois, acaba bateno errado, acerta as berada das nossa zorelha e dá a purretada no próprio dedão... Quando isso acuntece, eu avuo pra longe e me estatelo no chão ou nas parede.... Lá vão ocês atrás de nóis pra mode pregá de novo.

- Pior é quano acha nóis meio entortado. Ocês coloca nóis deitadim, bate ni nóis inté nóis ficá retim di novo. E pronto! Lá vamo nóis novamente levar na cabeça.

- Quando ocês bati errado na minha cabeça e eu entorto, pegam o chifrim do martelo, grudam no meu pescoço e me arrancam de quarquer jeito. Ou antão pegam o licate, juntam na minha cabeça me apertam, me espremem e me puxam de quarquer jeito tamem.

- E tem mais... Qual seu nome memo?

- Caipirinha! (respondi)

- Pois é sô Caipira! Tem mais! Ocês acham que eu sirvo pra pregá tudo. Querem me pregar nus concreto e lá num entro de jeito argum, pode bater, espancar, que lá nóis num entra. E como dói vê ocês bateno ni nóis e nóis num consegue se enfiar naquelas pedra dura e naqueles vergaião.

- As vez nóis, sem querer, se vinga de ocês. Quando ocês num querem mais nóis e joga nóis fora ou esquece nóis pregado nos pau, nóis enferruja tudo e ficamo jogado de quarquer jeito, cheio de bichim que fica ali, como num qué nada e pronto ... lá vem ocês e ... pimba ... pisa ni nóis, se estrambelha tudo e cai e bate com a mão ni nóis e pronto, nóis finca em ocês, num porque nóis qué, mas porque ocês são mei burrim e deixa nóis pelai.

- Pronto, lá se vão ocês pra modi prucurá um hospitár, um dotô pra modi toma umas injeção pro této.

Uai sô, num é que o preguim tem razão! E ele prosea bem. Num me deixo fala nada!

- Ocê qué sabê mais o que? Anda rápido que tô escurtano baruio de gente!

Antão me arresorvi preguntá pra modi quê sorte de prego é sempre iguar. Num muda nunca.

Então o preguim me arrespondeu:

- É que de um modi ou di outro modi, Nóis sempre leva na cabeça.

- É verdade! (respondi). Mas ele continuou ...

- Mas temo a coisa boa, levamo sempre na cabeça, mas temo serventia. Oia tudo aqui. Tamo nóis segurano as madera, os teiado, as porta, as mesa.

- Nóis pregamo em tudo e até ficamo bonito segurano os quadro das casa de ocês, pra modi ocês se alembrarem dos amigo, dos parente que se fôro, das paisage, da vida de ocês tudo!

- Ihhh lá vem o pessoá me buscar pra me enfiar em argum luga.

- Não preguim, vou te levar mais eu pra modi ti mostrar pro pessoar, quando eu conta essa história.

- Ta bão! Só num pode deixa eu me enferruja... Ou me pregá em quarquer lugá. To meio cansado e me prega num lugá molinho ta bão?

Bão! Eu to com o tarzim inté hoje guardado comigo. E ancim ele vai ficar.

Entendêro a história?

Sorte de prego num muda nunca. Ta sempre levano nas cabeça.

Inté!