QUEM PAGA O PATO?

MAURO MARTINS SANTOS

Em uma localidade bem distante de nós, um homem trabalhava em uma empresa, a qual ajudara a crescer, com muitos anos de dedicação exclusiva à sua expansão.

Era um empregado competente, honesto e trabalhador. Cumpria seus deveres à risca e sua seção era a melhor, mais organizada, por suas ideias criativas, sendo a que mais contribuía para o sucesso da empresa. Contudo, nunca recebeu um elogio rápido que fosse de seu chefe ou patrão, nem uma medalha de melhor operário do ano, conforme vários colegas já tinham recebido. Certo dia, cometeu uma falha insignificante, daquelas que nem figuram em regimento interno, mas foi severamente advertido por seu patrão, na frente dos colegas , ficando humilhado ao extremo.

Chegando em sua casa, sua mulher não estava. O que ele não sabia, nem procurou saber é que a esposa tinha ido à vizinha prestar-lhe ajuda, pois a mesma estava grávida e não estava passando bem devido a náuseas e dores de cabeça.

Era hora do jantar, e o marido sem esperar qualquer explicação da esposa, descarregou sobre ela toda sua raiva reprimida que alimentava contra o patrão:

- Trabalho igual a uma besta de carga, ajudo aos outros ficarem ricos, não deixo faltar nada, nem comida em casa e o que ganho é isto: chego em casa e a mulher está na rua batendo pernas. Preparar o jantar que é bom... nem um ovo frito. Que inferno!

Na verdade ele não estava dizendo aquilo para atingir a esposa, mas ao patrão, que o havia humilhado.

A mulher mediante aquela explosão de fúria, não tendo oportunidade de explicações, preferiu o silêncio, mas engoliu a raiva que lhe ficou entalada na garganta.

Nesse momento entra o filho, que estudava no período da tarde em um colégio distante de casa, vinha de ônibus que quebrou no caminho e o deixou atarantado e com fome. Do jeito que entra, vai deixando pelo caminho blusão em um lugar, mochila em outro, alguns livros em outro ainda, como se fosse um rastro. Deixando enfim seu material espalhado pela casa. A mãe esbraveja:

- É sempre assim, mãe não tem férias, feriados e nem descanso, o trabalho de mãe não acaba nunca e ninguém reconhece, você pensa que

sou sua empregada? Que tenho obrigação de pegar suas coisas espalhadas pela casa!? É já pegar tudo e guardar, senão já sabe 15 dias sem joguinhos no computador, no celular ou na TV.

Aquela mãe na verdade estava desabafando no filho, tudo o que desejaria falar ao marido.

O menino embirrou, fez pirraça e saiu batendo os pés indo para seu quarto. Ao entrar viu Nick seu cachorro, deitado em sua cama. Deu um pescoção e um chute no cachorro. gritando:

- Sai pra lá seu pulguento, se eu te pegar de novo na minha cama eu arranco suas orelhas...

Outra vez a transferência da raiva para outro alvo. O que fez e disse ao cão seu amigo, era endereçado de certa forma à sua mãe.

Da janela de seu quarto ele vê por coincidência ou não, o Nick dar o maior carreirão na Gatuxa a gata de estimação da casa e que nada tinha a ver com a história.

- Teria o comportamento humano afetado até os animais domésticos, perguntaria um ratinho, pondo seus bigodes de molho. Gatuxa bem poderia se voltar contra ele, de acordo com a corrente que se formara de ódio e raiva contidos, depois aflorados em quem nada tinha a ver com os acontecimentos impingidos aos outros personagens anteriores.

A tendência humana de sempre procurar alguém a que possa "pagar o pato" em quem descarregue sua fúria, forma uma cadeia que quase sempre recai em um inocente ou no elo mais fraco. Todo agressor carregado de ódio, despeito, frustração e mágoa, não raro comete atos de covardia, agressões, desarmonia, injustiça e violência, muitas vezes difíceis de serem reparados.

Mauro Martins Santos
Enviado por Mauro Martins Santos em 04/06/2013
Reeditado em 04/03/2015
Código do texto: T4324250
Classificação de conteúdo: seguro