Reminiscências - Maria Pêdra

Dentre as inúmeras figuras que habitou a minha querida Delfim Moreira, Maria Pêdra tem que ter destaque aqui.

Diziam que ela não gostava de ninguém. Penso que não era bem assim! Tanto é que ela foi casada e teve 2 filhos: José e Manoel que ficaram conhecidos como “Zé e Mané da Maria Pêdra”. E para gerar 2 filhos deve-se ter gostado de alguém.

Esses meninos herdaram o gênio da mãe e eram brigões e de difícil relacionamento. Quase ninguém gostava deles.

Mulher de hábitos simples. Simples como convinha a sua condição de pobreza e dificuldades que a vida lhe impunha.

Mas suas particularidades eram marcantes. Seus gestos firmes, opiniões convictas e expressões severas impressionavam e causavam respeito (entenda-se medo) a muita gente.

Tinha o hábito de “rogar praga” nas pessoas que ela não simpatizava ou a quem lhe negasse algum favor.

Dizia-se que ela tinha muitos inimigos e que a pessoa em que ela “rogava praga” era fadada ao insucesso ou deparava com algum azar na vida.

Mas isso não passava de lenda. Dentre os seus “famosos inimigos” estava meu pai Afonso Paulo, o “Cotia”. Isso porque, quando ele tomava umas e outras, ele a provocava.

Era comum ela visitar nossa fazenda, solicitando ajuda e nunca deixou de ser atendida.

Deve ser por isso que suas maldições não pegavam na gente!

Eu, e um dos irmãos mais velho, Sebastião Dirceu, passávamos toda manhã em frente a sua casa que ficava à beira da estrada, quando íamos da cidade para a fazenda.

Tínhamos o hábito de “sacrificar” algumas penosas alheias (frangos, galinhas, patos, etc) pelo caminho para comer quando lá chegássemos.

O Método consistia no seguinte: Meu irmão carregava um estilingue que manipulava com muita maestria.

Como era cedinho, e a maioria das pessoas estavam dormindo, ele abatia as aves que estavam na beira da estrada (acertava quase sempre na cabeça). Ainda vivas eu corria para pegá-las, colocava num embornal e em seguida corríamos...

Acontece que um dia ele abateu uma galinha da Maria Pêdra e prá nosso azar ela viu (não estava dormindo a marvada). Penso hoje que ela estava de tocáia.

No mesmo dia, ela muito brava, foi a nossa casa na cidade, registrar BO.

Chegamos à noite da fazenda, felizes, contentes e satisfeitos, ainda com o gosto da galinha na boca, a surpresa foi grande.

Minha mãe, cultivava uma enorme vara de marmelo, em cima do fogão de lenha. Dizia que era pra ficar mais flexível e doer mais quando a gente apanhava. E como doía...

Apanhamos bastante e ficamos com as pernas cheias de “vergões” por conta das varadas que recebemos. Meu irmão, coitado, levou uma cota maior.

No dia seguinte, tivemos que pegar uma de nossas galinhas e repor a que tínhamos surrupiado da Maria Pêdra. Que ainda nos passou um enorme pito.

Continuamos a abater penosas pelas estradas da vida, mas quando passávamos em frente a casa dela nem olhávamos na sua direção.

Há alguns anos, em uma de minhas visitas a Delfim Moreira, perguntei a um amigo sobre o seu paradeiro.

Ele me disse que ela já havia falecido e quando estava pra morrer fez um pedido:

Pediu que não fosse enterrada no cemitério da nossa cidade porque ela tinha muitos inimigos por lá. Mas não teve seu pedido atendido, evidentemente.

Teve que conviver com eles mesmo depois da morte.

Com meu pai não, porque ele foi sepultado em São José dos Campos.

“Saudosa” Maria Pêdra.

Paulo Kostella
Enviado por Paulo Kostella em 10/07/2013
Reeditado em 25/08/2014
Código do texto: T4380181
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