ABRINDO FALÊNCIA = EC

DEPOIS DA DERROCADA


   Antenor resolveu casar-se. Cansou da vida de solteiro, das mulheres eventuais, das noites solitárias quando não estava com disposição para sair.
 

   Sempre fugira do casamento, achava que sua vida de solteirão inveterado era o que de melhor podia ter, mas de repente começou a sentir que isso não preenchia sua vida, que não era bem isso o que queria e, resolvido, passou uma vista de olhos pelas moças casadouras da pequena cidade onde vivia. Qual delas? A Mariana? A Tânia? A Norma?

   Todas eram ótimas para um dia de festa, dançavam bem, bebiam na medida certa, tudo nelas era na medida certa, bonitas, de boas famílias, mas... Será que ele gostaria de levar uma delas para casa para compartilhar as alegrias e as tristezas... O resto da vida...?

   Foi então que Sheila chegou à cidade e encantou-se com os belos olhos verdes de Antenor, mas muito mais pela sua situação financeira. Ele era o maior industrial da região. Herdara o patrimônio dos pais e dos avós riqueza que ele usufruía com generosidade.

   Sheila era uma mulher atraente e não demorou para que conquistasse o jovem ricaço e o levasse ao casamento.

   Os primeiros anos foram felizes. Embora não houvesse uma paixão entre eles, havia amizade suficiente para tornar a relação agradável, pois os dois amavam a vida farta, os luxos, as viagens e, sobretudo a liberdade de cada qual fazer o que bem entendesse sem dar satisfação ao outro.

   Mas, de repente Sheila começou a perceber uma mudança no Antenor. Sempre taciturno, dormia pouco, comia mal, não queria sair de casa.

   Só quando a situação tornou-se insuportável, não conseguindo mais esconder a verdade, Antenor resolveu abrir-se: Estava falido.

   Sheila teve um choque:

   -- Que fazer agora? Como vamos manter o padrão de vida a que estamos acostumados?

   -- Como sobreviver, você quer dizer. Até esta casa nós perdemos.

   -- Com assim? Ninguém pode tomar a nossa casa.

   -- Pode sim. Eu a hipotequei e não consegui pagar a hipoteca. Temos um curto prazo para nos mudar. Eu não queria aborrece-la com isso, mas não tem mais jeito de disfarçar. Estamos pobres! Paupérrimos! Sem casa, sem renda, sem nada.

   -- Eu tenho uma ideia. Sou professora e posso arranjar algumas aulas, ganhar o suficiente para a gente ir vivendo...

  -- E eu serei o chupim? Sabe que antigamente marido de professora era chamado de chupim?

  -- Isso era antigamente. Atualmente muitas mulheres trabalham fora mesmo sem precisarem e os maridos acham isso muito natural. E depois você não precisa ser chupim. Pode arranjar um trabalho também.

  -- Eu? Como? Eu não tenho uma profissão, não sei fazer nada?

  -- Sabe sim. Tem muita coisa para fazer quando a gente quer trabalhar.

   Antenor não estava muito convencido, mas admirou a calma e a praticidade da Sheila.

   — Bem, o problema imediato, onde vamos morar?

   — Podemos ir para a praia. Temos uma boa casa lá.

   — E o que vamos fazer lá? O dinheiro que nos resta não vai durar muito e depois?

   — Por enquanto vamos veranear, tomar banho de mar, passear pela praia, tomar agua de coco, depois a gente resolve o resto.

   — Só você mesmo para me fazer rir num sufoco desses!

   Antenor acabou aceitando a sugestão de Sheila.

   Já tinham ido muitas vezes àquela praia, mas agora era diferente.

   Sempre havia muitos amigos dele ou dela, divertiam-se muito, mas nunca andaram só os dois pela praia, conversando, se conhecendo.

   Quando chegou a temporada de férias a cidade ficou animada com a chegada dos turistas e Sheila teve uma ideia:

   — Vamos fazer pastel para vender na praia?

   — E você acha que vamos ficar ricos com isso?

   — Ficar ricos não, mas sobreviver sim. Minha mãe fazia salgadinhos para festas quando eu era criança e sustentou a casa com isso. Porque não podemos fazer o mesmo?

   — Antenor não gostou muito da ideia, mas Sheila o surpreendia cada vez mais. Onde aquela mulher fútil com quem se casara e vivera tanto tempo sem pensar em nada que não fosse divertimento?

   Os pasteis foram muito bem aceitos. Sheila não vencia os pedidos e Antenor resolveu colocar um avental e ir para a cozinha também.

   Trabalhavam muito, mas nunca se sentiram tão próximos. Sheila estava sempre alegre mesmo quando estava quase caindo de cansaço e se uma ponta de desanimo ameaçava o Antenor, bastava uma coisa boba como um dedo sujo de farinha encostado em seu nariz para ele rir.

    Foi o começo de uma nova vida. No ano seguinte conseguiram arrendar um pequeno restaurante e assim aos poucos foram reconstruindo a sua vida e o que é melhor, descobrindo-se e se apaixonando um pelo outro.

—Só agora estou me sentindo realmente casado, com a minha família...

— É, mas família é Mulher... Marido... E Filhos...

— Já entendi aonde quer chegar! Por que não?

 
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Este texto faz parte do Exercício Criativo -
Abrindo Falência
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Maith
Enviado por Maith em 07/04/2014
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