Flores

Tranquila e estupendamente amarela: Assim terminava a tarde que invadia em delicados raios luminosos minha rotina em meio a todas aquelas estantes brancas, essas que abrigavam um conjunto de decoração impecável, entre vasos, kits completos para chá e esculturas industrializadas. Tudo ali parecia fazer questão de destacar seu própio brilho e toda a luz recebida se refletia fazendo com que o local se tornasse mais claro, elegante e favoravelmente disposto a atender aos caprichos das senhoras de alta classe. E para mim já era tempo de desejar algo sem classe alguma, algo simples que me tirasse mesmo que por um segundo daquele mar de ostentação, xícaras e sorrisos brilhantes.

E enquanto eu lamentava com olhos tristonhos, porém com postura e sorriso confiante, apropriados a uma vendedora de luxos, fez-se a porta do recinto uma silhueta. Era a de uma senhora por volta dos seus cinquenta e poucos anos. Singela véstia e olhos igualmente tristonhos. Dirigiu alguns passos e olhares de admiração ao fundo do ambiente e logo após houve silêncio.

“Senhora? Em que posso ajudá-la?” – proferi com gentileza, enxergando suas costas.

“Lindas flores essas no vaso.” – Respondeu ela ainda de costas.

Eu concordei e ao me aproximar pude ver que ela carregava consigo várias sacolas visivelmente pesadas. Imediatamente as recolhi e empilhei num canto sem que ela pedisse. Não se tratava apenas de gentileza, meu gesto era um pedido para que ela ficasse...por algum motivo.

“Sabe, eu gosto de observar as flores, não deixo de vir visitar sempre que encontro alguma por aí. Já tive uma floricultura em Recife e posso dizer que mantinha minhas flores mais por prazer do que por qualquer outro motivo. Elas eram minha alegria e lá era meu lugar. Porém, um de meus filhos adoeceu gravemente e assim viemos procurar tratamento aqui em Brasília, visto que já estava predestinada a vinda devido a uma parte de minha familia aqui residir. Infelizmente meu filho não resistiu e faleceu. Nunca mais retornei a Recife e desde então parei com as flores.”

Foi a primeira vez na qual ouvi falar de flores com um tom de tristeza tão sincero. Assunto esse para mim tão combinável a despedidas e MPB.

Senti o peito apertar, era como se toda a fragilidade que uma flor pode apresentar tivesse invadido meu ser e cavado um canto ao pé do que chamo de coração. Sorrindo, acariciei a delicada pétala com indícios de que estava prestes a murchar e pensei comigo:

“Eu também. Eu também parei com as flores...”

Bárbara_Marques
Enviado por Bárbara_Marques em 21/08/2018
Código do texto: T6425400
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2018. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.