*A chuva

A chuva

Eu cheguei a Teresina em julho de 2018, para participar de um evento literário e visitar amigos. Só que eu não sabia que os céus tinham preparado outro evento, à minha revelia.

Tarde do dia 19/07, quinta feira. De repente, o tempo começou a mudar. Esse é um fenômeno que não impressiona mais a ninguém. Temos dias em que, às 05h, os termômetros marcam 16 °C e, ao meio-dia, atingem 39 graus.

Tudo era muito esquisito. O sol já tinha pendido para o lado do Maranhão e estava encoberto por uma pequena nuvem negra que não tinha mais que um palmo de grilo de comprimento. Fato normal, se não tivesse passado por meu pensamento que era nuvem de chuva. À primeira vista, coisa sem cabimento, pois o inverno terminara em maio. Ademais, era vento contrário, coisa que eu nunca tinha visto. Essa chuva, se chuva de fato fosse, vinha do ocidente, das bandas de Timon, quando o normal seria vir do leste, lado do Ceará. A nuvem parecia ter sido posta lá de propósito, pois em toda a abóboda celeste não havia mais nenhum outro capucho de algodão.

Lá em casa, tinha um para-raios no quintal, desativado há bastante tempo, e eu pensei comigo: “Quer saber de uma coisa? Eu vou ajeitar esse troço, antes que nos aconteça uma coisa braba!”

Nisso, começou a chuviscar forte.

Minha sorte foi ter tido tempo para calçar umas botas e luvas especiais, feitas com borracha de pneus de trator. Vocês não as conhecem. As luvas são grandes, com mais de cinco centímetros de espessura, e as botas do mesmo material. Foi a sorte!

Quando toquei no para-raios, eu já senti um tremor e um clarão parecido com aqueles de solda elétrica. A descarga foi tão forte, que o cheiro de borracha derretendo tomou conta do quarteirão inteiro. Não é à toa que Teresina é conhecida como a Chapada do Corisco. Eu caí para trás, segurando na haste de ferro e a ponta do para-raios bateu no contador de energia. Pense agora na desgraça!

Isso causou um curto-circuito, que fez pipocar todas as lâmpadas da casa. Minhas mãos esquentaram tanto, que quando olhei as luvas, estavam derretidas e bem fininhas parecendo luvas de médicos. Vixi Maria!

Quem conhece Teresina, sabe que chuva, naquela região, não dura menos de duas horas ininterruptas, ainda mais aquela que já chegara de revestrés. Choveu o resto da tarde e a noite toda. E nós no escuro, num breu total.

Pela manhã, vimos que os estragos não foram pequenos. Lá de casa, dava para ver perfeitamente a frente da Igreja de São Benedito. A imagem do santo fica protegida por numa cavidade no alto, ao centro do frontispício. Como a chuva fora contrária, encharcara a imagem toda, que agora estava branca, branca não, amarela. Com o susto, a imagem soltara o menino no chão e colocara as duas mãos na cabeça. São Benedito branco só mesmo em Teresina! Os sinos badalavam roucos, cheios d’água, vazando pelas bordas. Sem dúvida, a imprensa alarmista já estava por lá.

Quando chamei o eletricista para refazer a fiação, ele constatou que o contador tinha rodando alucinadamente ao contrário e acumulara energia da descarga do para-raios para mais de dois anos. Imediatamente, mandei a concessionária (CEPISA) cortar a energia e agora, meu compadre Silvestre me avisou para ter cuidado com os vizinhos para não fazerem ”gatos”.

Sei não, viu... Acho que irei vender o excedente.

São coisas de minha terra.

PS.: Mandei esse Conto para o Festival de Mentiras do Piauí e fui desclassificado. Eita povinho que mente!

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Filosofia de botequim:

Se somos, realmente, o que comemos, então, eu sou um frango de granja.