O TESOURO ESCONDIDO

Jardel, 38 anos, casado, formado em Administração, trabalhador honesto, gerente de vendas de uma empresa de material de construção, morava em Belém, Estado do Pará, tinha em mente o desejo de comprar uma fazenda. Dinheiro ele tinha, pois herdara do pai, que falecera há pouco mais de um ano, uma quantia considerável. Já havia perdido a mãe, vítima de um acidente vascular cerebral, há pelo menos dois anos.

Ele e os irmãos conseguiram fechar o inventário e a distribuição dos bens se deu de forma pacífica. Não houve descontentamento algum por parte de cada um dos herdeiros que eram em número de cinco. Além dele, compunham a família os irmãos, Mateus, Filomena, Maria da Graça e Timóteo.

Com o dinheiro em conta, em uma única agência bancária da capital paraense, não via a hora de realizar seu antigo desejo: adquirir uma fazenda bem bonita no interior. Pesquisando em seu celular, em vários sites de anúncios de venda de imóveis, dia após dia, eis que encontra uma extraordinária fazenda, riquíssima em águas cristalinas, com 50 cabeças de gado. Era uma casa confortável, de muitos quartos e suítes. Possuía um acesso a três km do asfalto A topografia mista e grandes montanhas, belíssimas chapadas composta de lindas planícies no alto da serra com vista maravilhosa chamavam a atenção do pretendente à compra.

Não havia mencionado que Jardel era casado com Isadora, de 35 anos. Com ela tinha dois filhos: Sérgio, de 12 anos e Luíza de Marilac, com 10 anos de idade. O garoto, muito bonito, era parecido com o pai. A menina, esperta e curiosa, se assemelhava à avó paterna, já falecida. Os olhos eram negros e brilhantes. A esposa sabia do desejo do marido e não o incentivava porque temia que tivesse de largar a cidade onde moravam para residir no interior. Essa ideia não lhe agradava muito. No entanto, não se manifestava contrariamente e, num sábado à tarde, tendo combinado com o corretor de imóveis, senhor Saulo, rumaram em direção à fazenda anunciada.

A distância de Belém até a referida fazenda era de aproximadamente 90 quilômetros. Na cidadezinha de São Francisco do Pará. Dirigindo seu carro, uma caminhonete Hilux, Cabine Dupla, a seu lado ia a esposa, Isadora, por sinal muito bonita, morena de olhos azuis, cabelos pretos e longos. Tinha um olhar cativante. Os dentes muito claros e bem cuidados davam um toque especial em sua aparência, já que, sempre que algo lhe agradava, esboçava um sorriso gracioso. Sem considerar ainda que tinha um corpo escultural. Linda mesmo. Jardel era apaixonado pela esposa. Não demonstrava. O que se sabia é que ele tinha um ciúme muito grande da companheira. Quando desconfiava de que alguém a admirava, olhando-a mais profundamente, encarava e raspava a garganta, como se quisesse dizer: “tira o olho”. No banco de trás do veículo estavam seus dois filhos e o corretor que não parava de falar, comentando sobre as belezas da natureza, no caminho. Como era a estação da primavera, muito exuberante, pois, estava a natureza. Um verde suntuoso e uma abundância de flores enchiam os olhos de quem passava.

De repente o corretor dirigiu a palavra ao motorista, dizendo-lhe que a entrada para a fazenda já estava próxima. Um quilômetro, mais ou menos. Foi aí que, em poucos segundos, Jardel viu uma estradinha de terra, à direita, com uma placa. “FAZENDA SERRA DOURADA A 3 KM.” Jardel reduziu a velocidade do carro e, devagar, embora a estrada de terra fosse muito bem cuidada, seguiu o caminho. Olhou para a esposa, deu um sorriso e ela correspondeu. Tiveram uma ótima impressão do lugar e, não demorou muito, surge uma imponente construção: a fazenda. A entrada não podia ser mais agradável. Além de margear um lago e um bosque de eucaliptos, a entrada de acesso à casa foi decorada com lindos arcos de primaveras vermelhas (Bougainvillea spectabilis). A espécie, famosa pela sua florada espetacular, foi conduzida por estruturas de ferro chumbadas ao chão, 10 m distante uma da outra.

Jardel estacionou seu veículo debaixo de uma frondosa árvore, buscando proteger o carro do sol que naquele momento estava causticante. Descendo do veículo, o grupo foi recebido por um senhor que aparentava uns sessenta anos, cabelos brancos e barba bem aparada. Era um dos empregados do dono do imóvel. Com um sorriso, recebeu-os e disse que estava à disposição para mostrar a fazenda e os serviços que eram ali desenvolvidos. Criação de gado, plantação de milho, feijão e um arrozal na parte mais baixa, onde havia uma terra úmida e pantanosa.

O pretendente à compra da Fazenda Serra Dourada, juntamente com a esposa e filhos, ficaram encantados com tudo que viram. Era realmente algo deslumbrante e o dinheiro dava para comprar o imóvel. No entanto, Jardel, conversando com o corretor, fez uma contraproposta ao preço indicado, comprometendo-se ele de levá-la ao proprietário.

É importante ressaltar que a fazenda, além de ser um lugar aconchegante, possuía vários trabalhadores. Aqueles que cuidavam do gado e os que trabalhavam na agricultura. Todos os detalhes foram passados para Jardel que ficou deveras muito animado com a possibilidade de fechar o negócio.

UMA SEMANA DEPOIS

Era uma segunda-feira, por volta de sete horas da manhã. Jardel estava à mesa do café da manhã junto com a família, quando escutou o ruído da campainha. Ao atender, viu que o corretor de imóveis, senhor Saulo, estava acompanhado do dono da fazenda de quem ele estava esperando uma resposta para compra, senhor Pancrácio de Albuquerque, por sinal um homem muito discreto e simpático.

Jardel convidou-os para entrar e fez questão de que eles se sentassem e participassem do café da manhã com ele e a família. Em seguida chamou os dois homens e levou-os até aos fundos da casa onde havia um escritório. A conversa foi rápida. A contraproposta foi aceita sem restrições. Combinaram de contratar um despachante para providenciar a documentação e efetuar o pagamento que seria feito à vista.

Não demoraram quinze dias e os documentos ficaram totalmente disponibilizados e Jardel, muito feliz, pagou integralmente ao senhor Pancrácio e dele recebeu as chaves e toda a documentação da fazenda. Agora faltava pedir demissão do cargo que ocupava na empresa de materiais de construção e iniciar a nova vida como um fazendeiro, que na verdade, não era somente um cuidador ou morador do campo, mas um empresário na área de pecuária e agricultura.

Jardel não vendeu a casa em Belém. Afinal as crianças estavam em período escolar e não podiam abandonar os estudos. A esposa e os meninos iam para a fazenda nos finais de semana. Não era longe. Menos de cem quilômetros, Isadora era também motorista e dirigia seu veículo, um Honda Civic, novo, 2019. Quando havia feriado prolongado, a esposa e os filhos ficavam com Jardel na fazenda. Nas férias, os meninos aproveitavam. Havia alguns cavalos da raça Manga-larga Marchador e eles não perdiam a oportunidade de cavalgar, sob os cuidados de empregados da fazenda.

O tempo foi passando e Jardel cuidava bem dos negócios. Tudo às mil maravilhas. Um lucro muito bom na agricultura e o gado de corte também fazia com que o lucro aumentasse a cada dia.

Luíza sempre foi uma garota muito dócil. Na infância era tinha grande apego à avó materna, dona Jussara, com quem passava, às vezes, alguns finais de semana, sem contar que era a neta predileta. Quando a vovó Jussara faleceu, a menina entrou em depressão. Sofreu bastante. Foi preciso de um bom período para acostumar-se com a perda da avó.

Aos quinze anos de idade, Luíza teve um sonho. Nele a vovó Jussara, com o costumeiro sorriso, trajando um longo vestido branco, lhe fez uma revelação. Foi mais ou menos assim, conforme disse a menina:

“- Luíza, minha querida neta, sei que seu pai adquiriu uma belíssima fazenda. Gostaria de lhe revelar um segredo. A uns setecentos metros da sede da fazenda, próximo da cachoeira, aquela que fica pertinho da encruzilhada, pouco antes de se avistar o ponto mais alto da montanha, há uma árvore frondosa, um angico branco. Muito bem. Você encontrará, bem perto da árvore, algumas flores amarelas. Você conhece. São chamadas de douradinhas-do-campo. Quero lhe dizer que, você limpando com cuidado e arrancando a vegetação rasteira, encontrará um tesouro enterrado no solo. Não vou dizer qual é o seu conteúdo. Ele é muito valioso. Tão logo o encontre, você deverá chamar seu pai. Desejo muito sucesso nessa empreitada. Ah, não conte a ninguém o que você vai fazer. A não ser a seu irmão, Sérgio, que deverá acompanhá-la até o local e ajudá-la, neste trabalho."

A adolescente ficou muito espantada com aquele sonho e, de manhã, levou ao conhecimento de seu irmão a mensagem que recebera da vovó Jussara, na noite anterior. Ficaram cheios de curiosidade. Não disseram a ninguém, conforme lhe pedira a avó. Combinaram, pois, de ir até o local, naquele mesmo dia, pela manhã.

Sérgio, o filho mais velho, já com 17 anos e Luíza de Marilac, com 15 anos, não se cansavam de conhecer o grande local adquirido pelo pai. Vinte alqueires era muito espaço. Diante da revelação recebida, saíram os dois em cavalgada. Estava uma linda manhã. Não havia nuvens no céu. No dia anterior, uma chuva fina tinha caído durante muitas horas. A natureza, exuberante, certamente agradecia pela generosidade do céu. Pararam um pouco no meio do caminho e, num riacho, colocaram os animais para matar a sede. Em seguida continuaram a cavalgada até chegar à árvore, o angico branco, conforme a avó recomendara durante o sonho. Amarraram os animais no tronco da árvore.

Seguindo a orientação, não foi difícil encontrar o local indicado. A poucos metros da árvore, ela notou alguma coisa diferente no chão. As florzinhas amarelas estavam mesmo ali. Uma vegetação rasteira cobria o local, mas havia algumas falhas, aparecendo uma tampa de concreto. Lançando mão de uma faca que estava na cintura, Sérgio, cuidadosamente, foi limpando o local e perceberam que era possível retirar a tampa, não muito pesada, feita de cimento. E ai, a grande surpresa: uma caixa de estanho, tamanho de 1,00 x 1,00. Não foi difícil abrir. Suja de terra, mas em perfeito estado. Havia dentro dela várias barras de ouro e centenas de moedas antigas, também de ouro. Espantados, tremendo muito, os filhos de Jardel acharam por bem cobrir o lugar com alguns galhos de árvore. Montaram nos cavalos e foram a galope chamar o pai e contar a ele o fato. Revelando também o sonho que Luíza tivera com a vovó Jussara.

Jardel recebeu a notícia também com espanto. Calmamente, pegou a caminhonete, chamou a esposa e, juntamente com os demais membros da família, se dirigiram ao lugar indicado, sem dizer qualquer dizer coisa aos empregados da fazenda. Chegando ao local, removeram a tampa, abriram e viram a caixa. Naquele instante, uma emoção muito forte tomou conta da família. Todos, comovidos, choraram e ficaram em silêncio durante alguns minutos. Resolveram fazer uma prece pela alma de dona Jussara, agradecendo-a pela revelação. Vieram tantas dúvidas. Como aquela senhora poderia saber daquele tesouro? E o mais intrigante, revelar em sonho para Luíza, netinha de quem ela gostava tanto... Mas aconteceu de verdade. Jardel ficou alegre, mas ao mesmo tempo preocupado. O que deveria fazer com aquele achado tão valioso? Levar ao conhecimento de alguém? De algum órgão oficial ou se apoderar daquele monte de ouro encontrado.

Colocada no carro a caixa repleta de ouro, Jardel foi para a fazenda e fez uma reunião com a esposa e os filhos. A decisão foi permanecer em silêncio. Resolveu a família colocar a maior parte das moedas à venda através de um site. Parte do dinheiro ele depositou em uma conta aberta em nome dos dois filhos para, quando se tornassem maiores de idade, pudessem usar os valores. A outra parte doou para instituições de caridade locais. Essa decisão foi tomada com absoluta convicção de que seria a melhor forma de empregar aquele tesouro encontrado. Jardel era um homem bom e não tinha ambições. Sua fazenda era muito boa, dava lucro, pagava bem aos empregados... Achando que poderia ajudar a algumas instituições de caridade e guardar parte para os filhos, já que foram eles que haviam encontrado aquela caixa cheia de ouro, fez isso com tranquilidade com o aval de Isadora, sua esposa.

O tempo foi passando, passando.. Sérgio se formou como engenheiro agrônomo e Luíza se formou em Veterinária. Na fazenda, o trabalho era exaustivo, mas eles não mediam esforços para ajudar o pai que sempre foi um batalhador e dedicado à família. Ambos se casaram e, nos arredores da fazenda, foi construída uma casa para cada um deles. Com uma boa distância para que cuidassem de sua família de forma independente. A esposa de Jardel, cheia de charme e bondade, continuou em companhia do marido. Ambos viviam felizes, administrando, com amor, tudo aquilo que tinham conseguido. Claro que depois chegaram os netinhos para fortalecer mais ainda os vínculos familiares.

BH-31.03.2021

LUIZ GONZAGA PEREIRA DE SOUZA
Enviado por LUIZ GONZAGA PEREIRA DE SOUZA em 31/03/2021
Reeditado em 21/03/2022
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