A BOTIJA MAL ASSOMBRADA

 

No pequeno vilarejo Ponta do Cerrado, localizado no sopé da serra, lugar muito aprazível, com pouquíssimos habitantes, morava Abel. Homem muito trabalhador, porém passava dificuldades financeiras, mas ele tinha esperança que um dia as coisas melhorariam. Em uma determinada madrugada, Abel ao dormir teve um inusitado sonho, no qual, um ser sobrenatural, uma senhora de meia-idade, toda vestida de preto, dizendo ser uma alma penada, devido, ter deixado toda a sua fortuna escondida na terra. No sonho pedia para ele, desenterrar a botija, um pote de moedas de ouro para que ela pudesse descansar em paz. Em troca, ele teria que mandar celebrar uma missa em sua intenção e dividir o tesouro com alguém de sua estima. No sonho, a mulher dizia que a botija estava enterrada em uma tapera pertinho de uma bonita cascata, debaixo, do velho fogão e que ele deveria levar somente a pessoa escolhida por ele e mais ninguém. Logo, pela manhã, Abel foi contar o sonho ao querido primo Josué, que era seu vizinho e amigo dizendo da divisão do tesouro, autorizado pelo espírito e ninguém mais poderia saber, demonstrando muito medo em ir para tal missão. Sem ser visto, Sebastião, outro vizinho de Josué, escutou toda a conversa, não acreditando em tesouros, já sabendo da moleza de Abel, resolveu aprontar uma com ele. À tarde, fingindo não saber de nada, o convidou para assistir à brincadeira do copo na casa de um parente. No tabuleiro da brincadeira existia letras e símbolos, onde todos colocavam o dedo sobre o copo para formar palavras e frases. Já combinado com amigos, Sebastião e os demais conduziram o copo para formar a frase, afirmando da existência da botija na conhecida e única tapera do lugar, falada como mal assombrada. A intenção era, então, garantir a ida de Abel e Josué a busca do tesouro para dar-lhes um tremendo susto. Abel, perplexo, olhava para Josué de relance, já que para ele, só os dois sabiam do sonho. Sebastião, contou o segredo para um amigo, e os dois bolaram um plano mirabolante para atrapalhar a retirada da cobiçada botija. Abel e Josué, com a comprovação da veracidade do ouro, marcaram para a noite seguinte, a caça ao valioso tesouro. Durante o dia, ansiosos, prepararam as ferramentas necessárias, teriam que retirar a botija exatamente à meia-noite. Mesmo com muito medo, no horário combinado foram para o local indicado pela senhora, a velha tapera abandonada. Chegando no local, Abel tirou a calça para não sujar e a colocou sobre uma pedra existente debaixo de uma antiga mangueira. Acenderam uma vela grande, fizeram o Sinal da Cruz e Abel deu início a difícil escavação, e, Josué rezava em voz alta. Enquanto isso, os amigos escondidos, deram início ao ritual de assombração, jogaram a primeira pedra, Abel murmurou para Josué: - olha, é verdade, iniciaram-se os sinais, continuou com medo e mais apressado. A segunda pedrada quase atinge a cabeça de Josué que já ia no décimo Pai-e-Nosso. De repente, os galhos da árvore mais próxima começaram a balançar, Abel arregalou os olhos assustado e Josué retrucou: - o negócio aqui está assustador e perigoso, meia-noite, é a hora das almas penadas, disse com a voz trêmula. Abel, pensou um pouco e continuou, já descabelado de temor, mas na sua mente, vinha o rico potinho de ouro, que iria deixá-los afortunados. No mesmo instante, o vento frio apagou a vela, vozes abafadas e gemidos ecoavam de muito próximo. Abel todo arrepiado gritou: - o diabo é que fica aqui! Eu não. E pernas para que te quero, saiu correndo só de cueca, o pobre do Josué na escuridão gritava: -espera por mim, as tuas calças... Abel, voava, cabelos em pé, nem ouvia e nem olhava para trás, Josué também pegou o beco ofegante rezando o Credo em todas as alturas. Os dois envolvidos, ficaram de butuca na passagem de Abel e Josué que iam pálidos e desconfiados em virtude do tremendo susto. Muito frustrados por deixarem o medo impedir a retirada da valiosa botija, que segundo o trato com o espírito vagante, seria repassado para outra pessoa em um próximo aviso, caso ele não concluísse o combinado do sonho. E os dois assustadores, como não acreditavam na história da botija de ouro, estão até hoje rindo dos dois primos atrapalhados e medrosos.