Despetalando a Margarida

João é um cinéfilo convicto. Seu gosto por filmes é variado, detestando os de terror e suspense. Assiste filmes por diversão e com olho técnico, observando a posição da câmera, os efeitos de luz e sombra, detalhes do cenário, sem esquecer do enredo da trama. Em qualquer gênero assiste a película com imaginação cômica, por exemplo, em cena que envolve casal tirando a roupa para ir aos finalmentes, como jogando a camisa para um lado, blusa pro outro, sapatos voando etc., imagina-a como os dois estando “despetalando a Margarida” na clássica brincadeira do “bem-me-quer, mal-me-quer”.

Além do mais, João é uma pessoa séria, respeitado em sua comunidade, profissional competente, casado há duas décadas com a mesma mulher.
Estes dias, João contou, que estava em momento romântico com sua mulher, tinha preparado todo um clima especial para a ocasião, música italiana orquestrada, luz à meia sombra, carícias, palavras apaixonadas, quando a esposa cochichou:

--- Deixa eu tirar a roupa.
João, de forma automática, mas delicadamente, sem se demorar no que estava fazendo, dispôs-se à tarefa:
--- Deixa que eu faço isto. Então falou o impensado: --- Deixa eu “despetalar a Margarida”. Ao proferir esta frase percebeu que a mesma destoava do momento romântico, sua mulher voltou-se imediatamente para ele e, como não poderia deixar de ser, desatou em gostosa risada, os dois não agüentaram a comicidade e riram à vontade, chegando a doer o estômago de tanto rirem. Foram mais de trinta minutos de boas risadas. João tentou explicar-se: --- Não é a Margarida, é a Rosa. Só complicou a situação. --- Não, não é a Rosa é a flor. Tentava ele mais uma vez. A esposa contorcia-se em rir. --- Não é a Margarida, não é a Rosa, pode ser a Violeta ou a Hortênsia, e ria sem parar.

Depois deste acidente de percurso muitos pensariam que era o fim do aconchego amoroso, do momento romântico, que João ia brochar, ledo engano, quarenta minutos depois, refeitos do riso, amaram-se gostosamente.

Passado o acontecido João tentou se explicar, reportando-se à cena de cinema, acima exposta.

Quando o amor desabrocha em dois corações, também existe cumplicidade, bom humor, confiança mútua. Foi o ensinamento que João deixou, ao contar esta história.