AMARGO DESEJAR

AMARGO DESEJAR

Balduino acolhia a vontade de tornar mais cedo que de costume. A inquietação atazanava. Alguma cisma inusitada trabalhando na moringa. A pescaria se esticando, tensa, virou enfado no remanso da água. Os peixes pareciam não querer morder a isca, diabos, os danados não careciam de estar vendo o truque do anzol. Sentiu incômodo.

Os mosquitos picavam mais. O sol por detrás das nuvens desaquecia o costume de ficar no sombrio das folhas beirando riacho. Balduino espairecendo, adentrava fundo nos labirintos do mundo do pensar. Pescar, alteração instigante nas incertezas perturbadas, no doer da alma, maneira de amanhecer.

Quando puxava o peixe algo nele raiava vitorioso, resolvia uma coisa ou duas que causavam algum prazer. Nesse entardecer, a meia volta mais cedo para casa. Alguma desavença inquietava. O cão ladrava inquieto para o mato, para o nada. Sabendo nem porquê, mesmo cismado, ficado indo e voltava. Foi chegando, matutando que a aflição era coisa passageira.

Logo Ritinha estará dando aconchego. Aquele odor de sabão de coco, desterro desejado, somando-se à maresia do sovaco cabeludo de encher de fungado, rapé abençoado das narinas. Matutou manter a língua por entre os pelos. Segurá-los entre lábios, sentindo o gosto de suor que fazia o lastro arribar e mergulhar fundo na xereca lambuzada.

Foi chegando devagar até que chegou de vez. Sabia, não devia de ter tornado tão logo cedo. Assuntou o esgar, o gemer, tivesse traçando a mandioca de costume que não a dele, estranhou. Não com ele estava na bolinagem, na esfregação. O ir e vir escabroso, fraudulento, sons arretados de quem está com dor de parto, mas era de pura e escrota provisão de bolinamento. O querer ficou canhestro, sem jeito. Ritinha filha da puta, as lembranças boas viraram essa vil calamidade.

Chegou a sentir os chifres forçarem saída na cabeça ardida. Dor de corno é isso, então fica sabendo. A boca do mundo xinga: “chifrudo”. Fazer o quê? Ritinha, carnuda rococó, redondosa, convite para tudo que serve para o venha cá, o vamos ver, o chegar mais, como o touro enreda a vaca. Ele que vinha até ela com o pensar do reprodutor da fazenda a mugir nas éguas o taludo manjubão.

Se entrepernas tivesse algum parecido, já tinha ido, Deus sabe, fazer a vida traçando as mulheres da cidade longe. Ali ficou com o dele na palma calejada nos raiar de sóis, cortando madeira dura no ferro frio da garoa, molhando a camiseta rasgada com nome e o número do filho da égua candidato a deputado nas eleições do patrão, sujeitinho ordinário, intrujão.

Ele ali, todo raiar de dia fazendo lenha das árvores. Amassando a farinha de mandioca entre os dedos, não queria por bem nem por mal ser da raça dos jagunços a serviço dos furdunços. Vontade de chegar à mão na desavergonhada e cortar as vergonhas do cão. Conteve o instinto criminoso.

Ritinha não era mais sua santa. Conteve o ímpeto, se mediou. Caminhou para longe, muito, como se quisesse afastar para lugar tão distante que não viesse a atinar a volta. Nunca jamais.

DECIO GOODNEWS
Enviado por DECIO GOODNEWS em 18/01/2024
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