A morena e o diamante

Ela riu... do outro lado do bar. Ele não a viu. Enxergou apenas seus olhos e abaixo um lindo colar. Ela mostrou o ciso, com aquele riso de dar água na boca de qualquer marmanjo maluco por mulher bonita. E ele, ainda assim, não a viu. Enxergou o diamante, gigante, e lembrou de um tempo; um bom tempo, não tão distante.

“Ah, se aquele diamante fosse meu, não pensaria duas, três, nem meia vez. Pro penhor ele ia, pro banco, dinheiro não faltaria, pra hipoteca... Ah... maldita hipoteca que me tira o sono e a vergonha na cara. S'eu fosse como dantes... Ah quisera não ser como agora!” E ela retirou, delicadamente, um fio de cabelo, levemente encaracolado, de cima do seu colo... Pra mostrar essas coisas que os homens gostam de ver em mulheres lindas de vestido preto tomara, "Ah... tomara", que caia. Os olhos dele brilharam, o diamante era maior que seus sonhos. Maior até que a coragem da garrafa vazia do uísque de 21 anos. Ah... seus 21 anos, era um moleque faceiro, festeiro...cheio da vida dos pais. Como era bom o tempo de faculdade, o tempo de vadiar pela cidade...de andar absorto pelo mundo; como era bom aquele vasto mundo, quando ainda o chamavam de Raí e não Sr. Raimundo! Ela sorria, imponente, com seu colar latente e sua vida vazia. Luzia...o colar luzia... a cama fria, noite e dia, sempre sozinha, sempre cheia de gente que não gosta de ninguém. Ela, d’outro lado do bar, com gosto de champanhe francesa nos lábios, com aquele vestido preto importado, cheia de si, cheia de nada. Ele, lembrando da vida perdida, daquela loira maldita, que levou sua fortuna, que por ventura, não era tão grande. “Ah... aquela branquela fingida, alta, linda... . Levou tudo, minha dignidade, minhas verdades, minha saudade”.

Aquele colar era a solução, “E porque não?”. Num ato impensado, levantou os pés do chão, e foi em sua direção. Seus passos lentos, seus olhos atentos, reconheceram o esplendor. Encontrou os olhos dela, "Ah é ela!", aquela loira bela, a ruína da sua vida, aquela bandida, ladra; que sua fortuna, um dia, levara. “Com licença, mas eu conheço esse diamante, ele era do teu amante, um belo e jovem rapaz, de um tempo não muito distante”. Os olhos dela saltaram de surpresa, o medo de ir presa “ Como ele me encontrou? Vadio... como foi que descobriu?”. Ela correu, para ali e para lá. Tropeçou no sapato, caiu do salto e foi para o chão. Ele veio em sua direção, olhou-a profundamente nos olhos, abriu os lábios para esboçar sua ira, mas calou-se. Os cabelos estavam por cima, mas ele ainda luzia. Esticou a mão, tateou seus fios encaracolados, e o sentiu. Tocou o colar, sentiu o coração, novamente, pulsar. Toda sua vida, de volta, e de novo, como nunca deveria ter deixado de ser. E neste momento, os olhos dela, marejados, encontraram os seus, embriagados. Ele lembrou, do tempo de enamorados, dos sonhos, juntos, planejados. Da sua juventude, de toda magnitude, da vida conquistada. Vida essa, por esta morena falsa no chão, que lhe foi roubada. Desceu até onde ela estava, aproximou-se, e apaixonado pelos seus olhos, ela quase foi perdoada. O diamante luziu, o riso se fez presente, novamente. Num ato impensado, no momento exato, do seu pescoço, ele o tirou. Os olhos dela, "Ah, quanta dor!", seu lindo diamante, o seu antigo amante levou.

(Fê Jacomassi)

(maio/08)